A economia mundial, que já seguia abalada pelos desdobramentos da crise de 2008/2009, vem sendo agora impactada por acontecimentos dramáticos. Além das impressionantes manifestações populares que se verificam no mundo árabe (cujo diagnóstico é bastante complexo e o desfecho imprevisível, mas que impactam de imediato os preços internacionais do petróleo, provocando alta e volatilidade), em 11 de março o Japão foi atingido pelo maior terremoto de sua história, seguido de um tsunami que arrasou o nordeste do país e fez acima de 24.000 mortos e desaparecidos.
É quase que inevitável um período de retração no país com conseqüências sobre a recuperação global. Os investimentos, por exemplo, tendem a esperar uma melhor definição da duração e intensidade dos efeitos da crise no Japão sobre a economia mundial. Logo após os acontecimentos no Japão, se avaliava que a crise seria de curto prazo, durando enquanto os canais de distribuição e produção de energia estivessem bloqueados, com conseqüências mundiais, é claro, em função da importância da economia japonesa no contexto internacional. Mas a crise advinda do vazamento nuclear ocorrida em algumas das usinas nucleares atingidas vem mudando significativamente o teor das previsões.
Tanto os acontecimentos nos países árabes quanto o problema nuclear no Japão tendem a alterar profundamente, por exemplo, o cenário global de fornecimento de energia. Vários governos em todo o mundo vêm revendo as suas previsões de investimento em energia nuclear, que vinha passando, nos últimos anos, por uma espécie de renascimento. Para se ter idéia do que isso significa, a China, o Vietnã, a Tailândia e outros países asiáticos têm planos para a construção de mais de cem usinas atômicas, visando diversificar as fontes de provisão de energia, já que são países extremamente dependentes de petróleo, gás natural e carvão.
Um dos riscos aventados pelos especialistas em economia internacional é o de repatriação dos capitais japoneses espalhados pelo mundo, o que pode causar embaraços para países que têm déficit em conta corrente do balanço de pagamentos e forte presença de capital financeiro de origem japonesa, caso do Brasil. Por enquanto, o impacto mais forte se fará sentir nos países vizinhos que formam com o Japão uma zona industrial bastante integrada, envolvendo China, Japão, Índia e Coréia do Sul, além de outros países asiáticos. Esse bloco de economias gera metade de sua corrente do comércio dentro dos próprios países que o integram. Somente para o bloco asiático o Japão exporta anualmente cerca de US$ 450 bilhões. O Japão é também grande consumidor de componentes industriais produzidos na Coréia do Sul, Índia e China e a interrupção na produção de automóveis e autopeças no Japão, pelo menos até meados de abril, deve afetar o ritmo de produção industrial nesses países. Com exportações em 2010 que alcançaram US$ 767,8 bilhões, o Japão é uma fonte fundamental da produção de componentes de alta tecnologia, muito consumidos na Ásia e em outras áreas, como chips de computador, eletrônicos, automóveis, aço, produtos químicos, máquinas e equipamentos.
De qualquer forma, aparentemente, os efeitos mais danosos deverão ocorrer no curto prazo. Segundo informações divulgadas pelo governo japonês, o custo econômico do terremoto e do tsunami chegou a US$ 309 bilhões, valor corresponde aos danos das infraestruturas, das casas e das empresas do nordeste do Japão. A catástrofe pode diminuir o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 0,5%, segundo o governo japonês. As áreas do país mais afetadas (regiões de Iwate, Miyagi e Fukushima), juntas, representam apenas 4,1% do PIB. Mesmo estimando que 30% da capacidade econômica dessas áreas tenha sido atingida (numa previsão pessimista), se teria uma perda na produção de apenas 1,2% do PIB japonês, avalia o governo.
Na Europa, que segue sofrendo os efeitos da crise financeira, a bola da vez é Portugal. O país irá precisar, segundo alguns analistas, de até US$ 100 bilhões, para acertar as suas contas e se ajustar ao padrão da União Européia, e no dia 6 de abril anunciou que recorrerá ao apoio da União Européia. A situação é tão grave que, em face da recusa do parlamento de um novo programa de austeridade proposto pelo primeiro-ministro português, este se viu forçado a pedir demissão, conforme promessa anterior.
A oposição parlamentar até aceita o corte de gastos proposto, mas não novos aumentos de impostos. Em 2010, o déficit fiscal atingiu mais de 7% e a dívida pública chega a mais de 80% do PIB, sendo que este só cresceu mais de 1,5%. A ajuda do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do BCE (Banco Central Europeo) deve se concretizar, porém Portugal terá que fazer um ajuste pesado, que certamente levará a uma recessão em 2011, conforme estimativas.
Além dos problemas econômicos e financeiros, em si, a opção européia de enfrentamento dos mesmos com políticas fiscais contracionistas e de arrocho salarial, tem gerado grande resistência social, com dezenas de manifestações de muitos milhares de pessoas em vários países europeus. O pior é que os resultados deste tipo de política, se acontecerem, virão no médio e longo prazos. O grande receio geral dos analistas é o de que a crise portuguesa se espalhe pela Zona do Euro, levando a outra onda de crises na Europa, com potencial de contaminar a economia mundial.
Uma das discussões que tem sido feita nos países desenvolvidos é a de que o prejuízo financeiro decorrente das crises no Japão e na Europa pode não ser mais absorvido pelos países ricos, que já estão sobrecarregados pelas suas próprias crises e com situações fiscais no limite do suportável. A média de endividamento dos governos de países desenvolvidos em 2010 era de 74%, o nível mais elevado desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Um problema adicional é que essas economias, já bastante maduras, crescem mais lentamente que a média mundial, o que dificulta a melhora da situação fiscal no curto prazo. Segundo estudo recente do FMI, cinco países – Japão, Grécia, Itália, Portugal e Islândia- já atingiram seus limites de endividamento, o que significa que terão que, provavelmente, em algum momento, tomar medidas mais fortes que as anteriores, se quiserem manter a dívida controlada.
Opinião dos economistas – José Alvaro Cardoso e Adhemar Mineiro