Artigo: “A farsa da indústria dos atestados médicos – em se plantando, tudo dá!!!”, de Eduardo Guerini

Guerini vai colaborar periódicamente com seus artigos aqui no Palavra Livre

Com a anuência e generosidade do cientista político, professor universitário e mestre em Gestão Pública e Sociologia Política, Eduardo Guerini, reproduzo aqui seu artigo em que aborda o tema dos atestados médicos que afastam trabalhadores de suas funções, base de matérias na imprensa regional catarinense.

Guerini, sempre afiado, critica a mídia e propõe o pensar sobre a saúde dos trabalhadores catarinenses. A ele o meu agradecimento especial pela participação aqui no Blog, que deverá ser periódica. Com vocês o pensamento de Eduardo Guerini, confiram:

Nossos atarefados jornalistas da mídia provinciana se apressam em conclusões grotescas sobre  uma tal “indústria de atestados médicos” que assola o combalido Estado catarinense.  E assim,a reportagem  “esquartejada” em bifes insonsos começa a  traçar uma estratégia pueril de atacar novamente os setores mais  atingidos pelas reformas estruturais nas condições de trabalho :  Educação ,  Saúde e Segurança Pública.

Em proporções se apresenta uma série de dados, sem a devida análise – coerente e temporal, demonstrando uma vez mais, que estatística não tem sido uma matéria  apreendida pelos  nossos  novatos jornalistas.  Eis que ,  a  proporção de atestados  apontado como exagerada  no Estado catarinense em 2012, atinge  13,2%  do total de servidores (75 mil servidores ativos),  e,  nosso INSS,  apresenta uma proporção  de apenas 3,97% do total de  trabalhadores inscritos, em 2011, não considerando que o sistema de perícias  de tal instituto  é  marcadamente  merecedor do título de “calvário que leva a morte por exaustão”, visto que   a política é impedir a qualquer custo o  afastamento – para conter uma das pernas do “rombo previdenciário”.

Na edição do DC , de  13 de janeiro de 2013, surge  a  empulhação midiática, quando  em números absolutos são apresentados os dados da FIESC, de 2010,  apontando um total de  afastamentos na ordem de 12,6 mil empregados do total de 734 mil trabalhadores – o que  perfaz  a proporção de apenas 1,71 % aproximadamente.  A pergunta que fica: qual a comparação possível entre ramos tão distintos???

Os estudos  de grande envergadura sobre as condições de trabalho  da maioria das categorias que  estão envolvidas com  o trabalho social,   apontam para  um ritmo imposto pela tecnologia,  formas de precarização,  sobrecarga de atividades que produzem uma gama de trabalhadores “estressados” que se sentem incapazes  de enfrentar determinadas situações  no ambiente de trabalho.

O termo cansaço físico – usual para indústria, passou a ser  “cansaço físico-mental” na economia high tech. O ritmo do processo de trabalho acelerado para além dos limites  de suporte do organismo humano,  geram  um aprofundamento  das relações de sofrimento e emprego.

O esgotamento profissional que atinge os profissionais da Educação,Saúde e Segurança  Pública no Estado catarinense  não tem nada  com a chamada “Síndrome de Burnout” ou “ Síndrome de Bororo”, que nossa  ansiosa mídia provinciana  tende a escamotear. Em nenhum momento,as questões sobre uma política de “Gestão de Pessoas”,  de melhoria das condições de trabalho  ou remuneração  foram tocadas, mesmo que marginalmente.

Algumas dúvidas sobressaem da atenciosa matéria sobre a“indústria dos atestados médicos” que supostamente assola  o serviço público estadual catarinense :

a)  Tal situação não foi criada por uma gerência política orquestrada pelas forças políticas  que  conduzem os setores estratégicos do Estado ?

b) Seriam estes capatazes da “coisa pública” e seus “interesses privados” os principais  mentores em divulgar tal situação para justificar  uma vez mais  a  pecha  de “funcionários do Estado” como absenteístas  e responsabilizá-los pela decadência educacional estatal, caos na saúde pública e (in) segurança pública?

c) Seria proposital o adoecimento dos trabalhadores da Educação, Saúde e Segurança Pública, a ponto de se intitular em outra matéria como “epidemia”?

Em resumo,  a sequência de reportagens atribui exclusivamente ao miserável trabalhador,  que em condições precárias, com salários aviltantes e gestores politicamente indicados, esconde a verdadeira  “epidemia” que assola a administração  pública – somos conduzidos por gestores inaptos e ineptos, em situação politicamente desviante.

Assim,nossa mídia monopólica  e provinciana , segue o fatídico histórico desenhado nos primórdios de nossa colonização:  “Em se plantando , tudo dá….”

Autor: Salvador Neto

Jornalista e escritor. Criador e Editor do Palavra Livre, co-fundador da Associação das Letras com sede no Brasil na cidade de Joinville (SC). Foi criador e apresentador de programas de TV e Rádio como Xeque Mate, Hora do Trabalhador entre outros trabalhos na área. Tem mais de 30 anos de experiência nas áreas de jornalismo, comunicação, marketing e planejamento. É autor dos livros Na Teia da Mídia (2011) e Gente Nossa (2014). Tem vários textos publicados em antologias da Associação Confraria das Letras, onde foi diretor de comunicação.

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