Um passo histórico que dispara os alarmes em alguns países do norte da União Europeia, ao mesmo tempo em que alenta esperanças para os do sul. A Comissão Europeia aprovou nesta quarta-feira um plano de recuperação econômica contra a pandemia num valor de 750 bilhões de euros (4,42 trilhões de reais). Dessa quantia, 500 bilhões de euros correspondem a subsídios a fundo perdido, e os outros 250 bilhões de euros a empréstimos.
Pela primeira vez em 60 anos, o clube comunitário se dispõe a se endividar maciçamente nos mercados financeiros. E, sobretudo, pela primeira vez na história da UE, Bruxelas transferirá parte desses recursos em forma de subsídios a fundo perdido para os países mais golpeados por uma crise tão inesperada como devastadora. Fontes comunitárias indicam que dois terços do plano, meio trilhão de euros, serão injetados como subsídios, distribuídos com uma cota de partilha que favorecerá os países mais golpeados pela pandemia. O restante, 250 bilhões de euros, será distribuído na forma de empréstimos, sem cotas por países, mas com salvaguardas para garantir que nenhum sócio absorva muito em detrimento do resto.
A presidenta da Comissão Europeia (Poder Executivo da UE), Ursula von der Leyen, anunciará o projeto publicamente nesta manhã perante o Parlamento Europeu. Mas o comissário (ministro) europeu de Economia, Paolo Gentilloni, um dos principais impulsionadores da iniciativa, já revelou pelo Twitter o montante desse fundo de recuperação.
A cifra fica longe dos 2 trilhões de euros que o Parlamento Europeu solicitou em uma dura resolução aprovada neste mês, mas se aproxima do trilhão de euros discutido nos últimos dias. O documento que sairá dos quartéis-generais da Comissão deverá receber a luz verde tanto do Parlamento Europeu, muito exigente quanto ao alcance do plano, como dos Estados membros, onde se antevê uma áspera batalha. Segundo fontes da comunidade, a proposta que Ursula von der Leyen destina à Espanha 75 bilhões de euros em ajuda não reembolsável.
O “salto qualitativo na solidariedade europeia”, como o definiu o vice-presidente da Comissão, Josep Borrell, assusta alguns países do norte, que temem o começo de uma “união de dívidas” ou uma “união de transferências financeiras”. Para os sócios do sul, o novo Fundo de Recuperação é um sinal de esperança e uma compensação justa para manter um mercado interno que beneficia principalmente o norte e que, sem um reequilíbrio nas ajudas pelo coronavírus, poderia voar pelos ares.
As ajudas públicas nacionais autorizadas como resultado da pandemia já superam os dois trilhões de euros, mas quase metade disso foi concedida pela Alemanha às suas empresas, enquanto as ajudas oferecidas pela quarta maior economia do bloco, a Espanha, por exemplo, não chegam a 4% do total. O enorme desequilíbrio ameaça a capacidade de sobrevivência das empresas situadas nos países mais golpeados pela pandemia. E tanto Bruxelas como Berlim acabaram por reconhecer o risco de fragmentação do mercado se as empresas de todos os países não puderem competir em igualdade de condições.