Estudo diz que educação reforça desigualdades entre brancos e negros

Brasília - A presidente do Todos pela Educação, Priscila Cruz, participa de sessão solene da Câmara dos Deputados pela educação pública de qualidade (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
A presidente do Todos pela Educação, Priscila Cruz, diz que é preciso tem que dar as melhores escolas para a população negra e pardaFabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

A educação para brancos e negros é desigual no Brasil, segundo dados educacionais organizados pelo movimento Todos pela Educação.

Os brancos concentram os melhores indicadores, é a população que mais vai à escola e conclui o estudo. São também os que se saem melhor nas avaliações nacionais.

Para o movimento, a falta de oferta de uma educação de qualidade é o que aumenta essa desigualdade. O estudo foi divulgado hoje (18), dois dias antes do Dia da Consciência Negra, comemorado em 20 de novembro.

Os negros, soma daqueles que se declaram pretos e pardos, pelos critérios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são maioria da população brasileira, 52,9%.

Essa população, no entanto, ganha menos da média do país, que é R$ 1.012,25, segundo dados do IBGE de 2014. Entre os negros, a média de renda familiar per capita é 753,69 entre os pretos e R$ 729,50, entre os pardos. Os brancos têm renda média de R$ 1.334,30.

Os dados seguem apontando a desigualdade, o desemprego é maior entre os pretos (7,5%) e pardos (6,8%) que entre os brancos (5,1%). O trabalho infantil, maior entre pardos (7,6%) e pretos (6,5%), que entre brancos (5,4%).

As desigualdades sociais são reforçadas na educação.  A taxa de analfabetismo é 11,2% entre os pretos; 11,1% entre os pardos; e, 5% entre os brancos. Até os 14 anos, as taxas de frequência escolar têm pequenas variações entre as populações, o acesso é semelhante à escola.

No entanto, a partir dos 15 anos, as diferenças ficam maiores. Enquanto, entre os brancos, 70,7% dos adolescentes de 15 a 17 anos estão no ensino médio, etapa adequada à idade, entre os pretos esse índice cai para 55,5% e entre os pardos, 55,3%.

No terceiro ano do ensino médio, no final da educação básica, a diferença aumenta: 38% dos brancos; 21% dos pardos; e, 20,3% dos pretos têm o aprendizado adequado em português. Em matemática, 15,1% dos brancos; 5,8% dos pardos e 4,3% dos pretos têm o aprendizado adequado.

Em entrevista à Agência Brasil, a presidente executiva do movimento Todos Pela Educação, Priscila Cruz, diz que os indicadores são resultado de uma educação de baixa qualidade que não é capaz de fazer com que os estudantes superem as diferenças sociais.

Segundo ela, os estudantes mais vulneráveis têm também acesso a escolas com as piores infraestruturas e ensino. Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

Agência Brasil – O que esses dados nos mostram?
Priscila Cruz – Não adianta só a gente ter o diagnóstico de que o país é desigual e que a oferta da educação é desigual, a gente precisa começar a pensar em estratégias para que isso seja resolvido pela política pública porque o que esse estudo mostra é que existe uma baixíssima mobilidade educacional. A chance de um filho de pais analfabetos continuar analfabeto é muito grande e isso é mais forte na população negra. Então, se a gente tem uma dívida histórica com a população negra, não basta só ter direitos iguais, não adianta a gente só dar direitos iguais a negros e pardos, a gente tem que ter políticas específicas na educação básica.

Agência Brasil – Quais seriam essas políticas?
Priscila Cruz – A gente tem que dar as melhores escolas para a população negra e parda, porque ela só vai conseguir romper o ciclo de exclusão e pobreza que estão presas há gerações com política pública específica. Não adianta ter diploma, é a qualidade que vai importar. Para conseguir qualidade, o estado tem que dar muito mais para a população historicamente excluída. Ainda tem um imaginário no Brasil muito forte de exclusão em relação aos negros. A gente naturaliza que o negro vai estudar em uma escola pior do que o aluno branco de uma renda maior. A gente precisa desnaturalizar isso. Para os negros, a gente tem que ter escolas com os melhores professores, melhor formados, investimento maior, apoio técnico das secretarias e governos. Essa é a lógica que a gente tem que instaurar no Brasil se a gente quiser reduzir desigualdade.

Agência Brasil – Seria investir mais naqueles que têm piores resultados. O inverso de uma política por mérito?
Priscila Cruz – Mérito é quando você está comparando dois pontos de partida iguais. A gente está dizendo o seguinte, que têm alunos que, em uma corrida de 100 metros, partem dos 50 metros; têm alunos que partem do zero. O dado de que um chega mais rapidamente no ponto de chegada que os outros não é porque tiveram as mesmas condições, é porque tiveram condições diferentes. A gente só começa a levar em consideração o mérito na hora de premiar, de dar melhores condições, quando se chega no mesmo patamar.

Com informações da Ag. Brasil

Negros já somam 52% da classe média brasileira

Negros, trabalhadores com ensino fundamental incompleto ou sem escolaridade e trabalhadores do setor formal foram os brasileiros que mais contribuíram para aumentar o número de pessoas na chamada “classe média” do país – brasileiros em famílias com renda entre R$ 291 e R$ 1.019 por pessoa, em 2012.

A definição, adotada pelo governo para indicar a população no estamento médio de renda do país, pouco tem a ver com o conceito sociológico de “classe média”, tradicionalmente ligado aos chamados trabalhadores de “colarinho branco” e nível médio de instrução. Nessa classe média, 64% tem, no máximo, ensino fundamental completo. De cada cem novos integrantes nos últimos dez anos, 64 não completaram o ensino fundamental.

O novo perfil da classe média brasileira à qual se agregaram quase 40 milhões de pessoas nos últimos dez anos será divulgado na segunda-feira pelo ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), Wellington Moreira Franco, em um fórum promovido para discutir o tema. O estudo da SAE, atualizado com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) de 2011, estima que a classe média representa, hoje, 52% da população brasileira (e não 53%, como se previu no início do ano) e cresceu, nos últimos dez anos, principalmente com o aumento de renda da população negra: de cada cem novos entrantes na classe média, 75 eram negros.

Os autores do estudo da SAE reconhecem ser polêmica a escolha do intervalo entre R$ 291 e R$ 1.019 per capita para definir a classe média, embora útil para verificar as mudanças no nível e na desigualdade de renda no Brasil. Argumentam, porém, que apenas 18% da população mundial ganha acima desse limite, e 54% estão abaixo do limite inferior de R$ 291. Por esse critério, é da classe alta uma família de quatro pessoas em que pai e mãe ganham juntos, R$ 4.077. O critério é reconhecido pela Organização pela Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que, no entanto, considera frágil a situação econômica dessa classe média emergente.

A SAE constatou que 28% da população, cerca de 50 milhões de pessoas, estão na classe baixa. O estudo mostra que, se o crescimento de renda tivesse ocorrido de maneira homogênea, sem mudar a distribuição de renda, o aumento da classe média teria sido menor. Cerca de dois terços do aumento da classe média nos últimos dez anos se deu, principalmente, pela redução da desigualdade de renda no país.

As regiões com maior número de pessoas que ascenderam à classe média foram o Sudeste (36% dos entrantes) e o Nordeste (34%), que concentram a maior parte da população nacional.

A maior transformação se deu, porém, nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste, o que, para a SAE, reduziu a disparidade regional no país. O Nordeste, que tinha apenas 22% de sua população na classe média, passou a ter 42%. O Norte passou de 31% a 48% e o Centro-Oeste, de 40% a 57%. O Sul, embora tenha sido a região com a menor expansão de percentual nessa faixa de renda (apenas nove pontos percentuais) é a região com maior proporção de pessoas na classe média, 58%.

Para a SAE, esse contingente da população agora reflete mais fielmente a heterogeneidade da sociedade nacional, ao reunir, por exemplo grande parcela de pessoas com ensino fundamental completo e também de analfabetos funcionais. Aumentou bastante o número de pessoas de classe média entre os trabalhadores informais: eram 38% em 2011; são 52% em 2012. Evolução quase idêntica ocorreu entre os inativos: em 2002, 38% eram dessa faixa de renda; hoje são 51%. No total de pessoas de classe média, porém, os trabalhadores formais são maioria: 58% da população ocupada nessa faixa de renda.

Com a entrada maciça de pessoas negras na classe média, os negros passaram de 38% desse segmento em 2002 para 52% em 2012. Vendo essa mudança por outro ângulo, os especialistas da SAE apontam que não só aumentou o número de negros na classe média como aumentou o número de pessoas de classe média entre os negros. Em 2002, as pessoas de classe média eram 31% da população negra; em 2012, essa proporção está em 52%.

A SAE constatou que, enquanto o número de pessoas de classe média aumentou para a maioria das atividades econômicas, ele se reduziu nos setores de administração pública e de educação, saúde e serviços sociais. Essa queda se deveu, porém, à elevação de renda nesses setores: o percentual de pessoas da classe alta na administração pública subiu de 33% em 2002 para 46% em 2012, e no setor de educação, saúde e serviços sociais aumentou de 35% para 48%. Em ambos os setores, caiu o percentual de pertencentes à classe baixa, com menos de R$ 291 de renda mensal por pessoa da família.

Do Valor Econômico via CNM-CUT

Grupo de Trabalho analisa o Código Penal sob enfoque racial

A SEPPIR – Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial criou ontem (26.06) um Grupo de Trabalho que vai debater com advogados negros atuantes em casos de discriminação racial no Brasil a nova redação do Código Penal e propor alterações à comissão jurídica do Senado que discute as reformas do texto. Os advogados apontam a necessidade, por exemplo, da inclusão da discriminação e preconceito raciais e da intolerância religiosa como circunstâncias agravantes genéricas – que podem fazer aumentar a pena em qualquer crime (um homicídio, por exemplo) no qual aquela seja a motivação. O encontro foi mediado pelo Ouvidor Nacional da SEPPIR, o advogado Carlos Alberto Souza e Silva Jr.

“Este GT tem como objetivo produzir não apenas uma avaliação, mas também propostas de mudança do Código Penal Brasileiro. Não é preciso dizer da importância que a questão penal sempre teve para a população negra no Brasil. Em muitos sentidos, o racismo se constitui através da criminalização da negritude. O fato de ser negro e as manifestações todas que se referem à presença negra no Brasil sempre foram criminalizados”, afirmou a ministra Luiza Bairros, na abertura do encontro.

Princípio da Insignificância – “O mais grave é a adoção, pelo projeto de lei que dá a nova redação do Código Penal, do Princípio da Insignificância, uma porta larga para quem entende que o racismo não tem nenhuma importância. Pelo novo texto, o juiz pode, por exemplo, não considerar o fato criminoso quando, em sua interpretação, for mínima a ofensividade da conduta do agente; for reduzidíssimo o grau de reprobabilidade do comportamento; e a inexpressividade da lesão jurídica. A maior parte dos juristas não está a par dessa alteração e do alto grau de risco que isso representa como retrocesso no enfrentamento do racismo”, destacou Hédio Silva Jr., advogado e ex-secretário de Justiça e Direitos Humanos do Estado de São Paulo.

Outro exemplo de retrocesso do novo texto proposto para o novo Código Penal e apontado pelo advogado é a retirada do chamado tipo penal aberto, em que há uma descrição genérica de determinada prática cujo conteúdo preciso vai sendo definido pela experiência, a jurisprudência, a interpretação feita pelos advogados, juízes e promotores.

“Por esta ótica, qualquer conduta violadora de direitos com base em discriminação racial é prática de racismo. Isto é o que se chama tipo penal aberto e que foi suprimido na nova redação. Há no novo texto uma estrutura dos delitos de preconceito e discriminação, dentro de um tópico chamado Crimes Contra os Direitos Humanos, em que, na verdade, essa terminologia – preconceito e discriminação – é usada referindo-se a outras modalidades discriminatórias, começando pelos idosos, deficientes até chegar no problema da discriminação racial. Embora seja uma tecnicalidade, o fato de se suprimir o tipo penal aberto fez com que hoje, no projeto de lei como está aqui, se a discriminação racial não se referir a acesso a educação, emprego público e empresa privada, não haja mais discriminação”, explica.

Alegoria – O advogado Dojival Vieira chamou a atenção para o risco de o racismo passar a ser tratado como “alegoria”, apenas no plano simbólico. “É preciso que nós apresentemos uma proposta alternativa em que o enfoque do Código Penal que enquadra alguns temas siga um modelo de Justiça criminal restaurativa, em vez de retribucionista”, disse Vieira, contrapondo os conceitos jurídicos que preconizam uma resposta que leva as vítimas, os delinquentes e a coletividade a reparar, coletivamente, os danos causados, através de soluções alternativas à prática jurídica tradicional, e aquela em que a imposição de pena tem exclusiva tarefa de realizar justiça.

Participaram ainda do primeiro encontro do GT os advogados Jorge Terra (Procuradoria Geral do Rio Grande do Sul e Rede Afrogaúcha de Profissionais do Direito), Eduardo Pereira da Silva (presidente da Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São Paulo), Marco Antonio Zito Alvarenga (Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo), Ezequiel Santos (Ouvidor da Seppir/DF), Antonio Mario (Seppir/DF), Daniel Teixeira e Kayodê Silva (Ceert), Sergio São Bernardo  (Instituto Pedra de Raio/BA), Elizeu Lopes e André Moreira.