Lei de Acesso à Informação muda relação do Brasil com a sua história

A Lei de Acesso à Informação está mudando a forma do brasileiro se relacionar com sua própria história. Desde que entrou em vigor, em 17 de maio, já proporcionou o acesso a registros históricos que, em muitos casos, poucos suspeitavam sequer que existiam.

No Arquivo Nacional, encontram-se à disposição dos interessados os documentos secretos e ultrassecretos do extinto Sistema Nacional de Informações e Contrainformação (SISNI), incluindo os serviços de inteligências da Forças Armadas, da Polícia Federal e de ministérios e outros órgãos do governo, como o Itamaraty.

Desde a manhã de segunda, também está disponível a base de dados da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), criada pelo ex-presidente Collor de Mello, em 1990, para substituir o Serviço Nacional de Inteligência (SNI), o temível órgão de inteligência da Ditadura Militar, idealizado pelo general Golbery do Couto e Silva. A SAE funcionou até 1999, quando foi criada a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN). E, embora tenha sido criada e extinta durante o regime democrático, herdou práticas de arapongagem da ditadura militar, colocando sob sua mira figuras emblemáticas, especialmente, para a esquerda brasileira.

Relegada a categoria de secretaria, a SAE não tinha o mesmo status do seu antecessor, o SNI, ligado à presidência da república, e que, mesmo durante o governo de transição do ex-presidente José Sarney, continuou monitorando esquerdistas, realizando escutas ilegais e operações clandestinas. Perdeu quadros, força e influência. Passou a ser comandado por civis. Voltou a ganhar peso com sua remilitarização, a partir de 1992, já no governo de Itamar Franco, que assumiu a presidência da república após o impeachment de Collor.

Em até 30 dias, será aberto à consulta pública o acervo do extinto Estado-Maior das Forças Armadas (EMFA), que funcionou entre 1946 e 1999, antes da criação do Ministério da Defesa. São 37 volumes de documentos considerados secretos e ultrassecretos, além de 52 volumes de boletins reservados: correspondências entre autoridades militares e civis do governo brasileiro ou entre integrantes do governo e representantes de outros países sobre temas relacionados à defesa, segurança nacional e cooperação internacional, além de relatórios sobre a conjuntura política nacional e internacional.

Acesso amplo e irrestrito

Desde o dia 18/6, já está permitido o acesso irrestrito aos acervos do próprio SNI e dos demais órgãos que compunham o SISNI. São dossiês pessoais dos considerados “subversivos” e de organizações de esquerda, como partidos políticos, sindicatos, movimentos sociais, igrejas, universidades e movimento estudantil, além de informações sobre prisões, mortes, tortura, repressão à guerrilha urbana e rural, entre outros.

Parte desses documentos já podia ser consultada desde 2005, de forma bastante restrita. No caso dos dossiês pessoais, apenas com autorização da própria pessoa ou de seus familiares. Nos documentos mais gerais, todos os nomes citados eram devidamente apagados. Por isso, grande parte dos documentos ainda é inédita para o público. Eles revelam, por exemplo, como se dava a infiltração dos agentes do regime dentro das universidades públicas ou mesmo a relação da ditadura com a política indigenista que dizimou aldeias inteiras de índios.

Há também os documentos produzidos pelo Centro de Informações do Exterior (Ciex), serviço de inteligência criado pelo Itamaraty em 1966 para monitorar os passos dos brasileiros tidos como “subversivos” no exterior e, da mesma forma, os dos estrangeiros no Brasil. Mostram o pioneirismobrasileiro na articulação da Operação Condor, criada pelas ditaduras da América Latina para a troca não apenas de informações, mas também de militantes estrangeiros nos países envolvidos.

Balanço

No primeiro mês de vigência da Lei de Acesso, o governo recebeu 10,4 mil pedidos de informações. De acordo com balanço da Controladoria Geral da União (CGU), mais de 70% foram respondidas, a maioria antes do prazo. Das respondidas, 82% atenderam ao pedido; 10% negaram e, em 7% dos casos, não se tratava da competência do governo brasileiro.

Do Correio do Brasil

Lei de Acesso à Informação entra em vigor hoje, fique atento e faça valer

A Lei de Acesso à Informação entra em vigor nesta quarta-feira (16/5) com o objetivo de garantir aos cidadãos brasileiros acesso aos dados oficiais do Executivo, Legislativo e Judiciário. Cada órgão público terá um Serviço de Informação ao Cidadão (SIC) para garantir a transparência dos dados públicos.

Com isso, o Brasil passa a compor, com outros 91 países, o grupo de nações que reconhecem que as informações guardadas pelo Estado são um bem público. Além dos gastos financeiros e de contratos, a lei garante o acompanhamento de dados gerais de programas, ações, projetos e obras. Oslinks nas páginas do governo federal que dão ao cidadão pleno acesso às informações são identificados por um selo em forma de balão amarelo de quadrinhos, com a letra “i” em verde.

Além de órgãos e entidades públicas dos três níveis de governo, as autarquias, fundações, empresas públicas e entidades privadas sem fins lucrativos que recebem recursos públicos devem colocar as informações à disposição do cidadão de forma gratuita.

Antigamente, o cidadão só podia solicitar informações que lhe diziam respeito. Cabia à chefia dos órgãos decidir sobre a liberação dos dados. Segundo a cartilha da Controladoria-Geral da União (CGU), feita para informar os servidores sobre a nova lei, na chamada “cultura do segredo”, a informação era muitas vezes retida ou até perdida.

Com a lei, o cidadão pode solicitar a informação sem necessidade de justificativa. De acordo com a CGU, são estabelecidas regras claras e procedimentos para a gestão das informações. Além disso, os servidores estão sendo capacitados para atuar na implementação da política de acesso à informação. Foi elaborado um formulário próprio para o pedido, que pode ser preenchido diretamente no órgão ou pela internet. Para ter acesso à informação, o cidadão deve se identificar e especificar o pedido.

Um dos entraves para a operacionalização das novas regras de acesso à informação é a regulamentação da lei, que ainda não foi concluída. De acordo com o ministro da CGU Jorge Hage, a regulamentação faz falta para a orientação que o órgão deve dar aos ministérios. Segundo ele, a CGU, que é responsável pela implementação da lei, recebe perguntas que dependem da regulamentação para serem respondidas.

A nova lei também dá fim ao sigilo eterno de documentos oficiais. Pela nova regra, o prazo máximo de sigilo foi limitado a 25 anos para documentos ultrassecretos, 15 anos para os secretos e cinco para os reservados. Os documentos ultrassecretos poderão ter o prazo de sigilo renovado apenas uma vez.

O servidor público que se recusar a fornecer informação requerida, a fornecê-la intencionalmente de forma incorreta, incompleta ou imprecisa e impor sigilo à informação para obter proveito pessoal ou de terceiro poderá ser responsabilizado civil, penal ou administrativamente.

Do Correio do Brasil