Recebemos email da Sociedade Joinvilense de Medicina (SJM) com uma nota contestando a decisão do governo Udo Döhler (PMDB) em cortar 56 vagas de médicos residentes no Hospital Municipal São José em Joinville (SC).
Contundente e didática, a nota expõe a fragilidade dos argumentos apresentados para o corte que vai afetar muito a já combalida saúde pública da maior cidade catarinense que, outrora, o empresário Udo Döhler iria resolver citando sempre o mantra “não falta dinheiro, falta gestão”.
Leia a nota:
As contradições de Udo Döhler
Contradição 1. Ministério da Saúde reconhece o papel fundamental do residente na assistência à saúde evidenciando que cerca de 39 milhões de atendimentos médicos são realizados por residentes, que são médicos graduados durante 6 anos e realizando especialização.
– Contudo, em Joinville, na contramão, essa mão de obra qualificada é marginalizada.
Contradição 2. O empresário de sucesso da indústria têxtil e alardeado como exímio administrador da área da saúde deteriora ativamente e a passos largos a maior instituição de saúde do município.
Contradição 3. O diagnóstico apresentado pelo prefeito municipal é de que o problema da saúde pública joinvillense não é dinheiro, mas gestão.
– Contudo, de uma hora para outra, o pagamento de 50 bolsas de residência médica e odontológica passaram a ser o centro do buraco monetário em que o HMSJ se encontra. Mas o problema não era gestão?
Contradição 4. Os gastos de cerca de 150 mil reais mensais relativos ao pagamento das bolsas dos residentes são tidos como insustentáveis.
– Contudo, o número de funcionários comissionados (às vésperas de ano eleitoral) cresce em ritmo jamais visto, incluindo no HMSJ.
– Além de tudo, as verbas destinadas à publicidade alcançam cifras de 15 milhões ao ano.
Contradição 5. O atual prefeito é reconhecido líder da classe empresarial da cidade e se vangloria do histórico de boa gestão da saúde na área privada.
– Contudo, como base para o cancelamento das matrículas, é flagrado a fazer a mais pura “contabilidade de padeiro” ou, no mínimo, deixa-se levar por assessores que realizam cálculos primários. Ex.: 50 bolsas de residência a Rs$ 2.976,26 cada resultam em desencaixe de Rs$ 148.813,00 mensais ou Rs$ 1.785.756,00 por ano aos cofres municipais.
– Contudo, não se leva em consideração que:
CENÁRIO 1
- 34 bolsas pagas pelo Ministério da Saúde =
MAIS Rs$ 101.192,84/mês
- 36 bolsas subsidiadas pelo ministério de Saúde através de repasse de incentivo do programa “Mais Especialistas” do governo federal =
MAIS Rs$ 108.000,00/mês
- As 50 bolsas restantes, a cargo do hospital, totalizam =
MENOS Rs$ 148.813,00/mês
IMPACTO NAS CONTAS MENSAIS: Rs$ 148.813,00 NEGATIVOS
CENÁRIO 2
- A subtração dos residentes resultará num déficit de atendimento muito grande com a necessidade premente de:
– Contratação e/ou concurso público para médicos hospitalistas :
– Embora a Secretaria da Saúde diga que não serão contratados novos médicos, a necessidade existe. O custo estimado de apenas uma escala de médicos hospitalistas clínicos para atendimento de intercorrências nas enfermarias clínicas é de aproximadamente:
MENOS Rs$ 90.000,00
– O custo estimado de uma escala de médicos para atendimentos na emergência interna do hospital resultaria é de aproximadamente:
MENOS Rs$ 90.000,00
– Custo estimado de apenas uma escala de médicos hospitalistas cirurgiões para atendimento de intercorrências nas enfermarias cirúrgicas é de aproximadamente:
MENOS Rs$ 90.000,00
– O custo aproximado da contratação de (apenas) uma escala de médicos que atuem como cirurgiões auxiliares dos atos operatórios (como é determinação do CFM) é de aproximadamente:
MENOS Rs$ 90.000,00
– A interrupção do repasse do incentivo do “Mais Residências” que ocorreria em função da medida administrativa em pauta seria de:
MENOS Rs$ 108.000,00
IMPACTO NAS CONTAS MENSAIS: Rs$ 468.000,00 NEGATIVOS
– O cancelamento das matrículas também impede qualquer possibilidade de se pleitear a condição de hospital de ensino, o que tira definitivamente a perspectiva de obtermos um incentivo mensal de Rs$ 220.000,00.
IMPACTO ADICIONAL MENSAL: MENOS Rs$ 688.000,00
Contradição 6. Fala-se em diminuir prejuízos,
– Contudo, não se leva em consideração que há uma grande diferença em desembolsar Rs$ 150.000,00 e Rs$ 688.000,00.
Contradição 7. O programa de governo visava melhorar a assistência à população, fato que necessariamente requer investimentos.
– Contudo, não se leva em consideração que o crédito de uma ação política não reside apenas em valores monetários, mas no bem-estar da população.
Contradição 8. O País inteiro vivencia a carência de médicos especialistas e cria-se o programa “mais médicos” e “mais especialistas”. A residência não é mera mão de obra médica que atende à população, mas é um grande multiplicador de conhecimento e melhorias da assistência à saúde em todo o município.
– Contudo, em Joinville, vagas de formação de especialistas são fechadas.
Contradição 9. Recentemente, a “gestão” atual assinou convênio com Ministério da Saúde e Ministério da Educação Hospital comprometendo-se a abrir mais vagas de residência.
– Contudo, menos de dois anos depois, toma a intempestiva e desmedida ação de suspender as matrículas de novos residentes já aprovados em concurso.
Contradição 10. O governo atual prega a honestidade e a lisura dos processos.
– Contudo, “rasga-se” um edital público que é um compromisso com a sociedade e teórica garantia de transparência, toma-se atitudes autoritárias sem a devida consultoria técnica, utiliza-se do subterfúgio da publicação ao apagar das luzes de um feriado de Carnaval na tentativa de esvaziar os argumentos e movimentos contrários.
Contradição 11. A residência do HMSJ gera “prejuízo” – alegado pela prefeitura.
– Contudo, o hospital privado do município, administrado pelo prefeito municipal, abre vagas de residência multidisciplinar e se prepara para iniciar o programa de residência médica. Qual a fórmula mágica que faz o prejuízo não existir na instituição privada? O grande gestor da saúde não previu o dito prejuízo?
Contradição 12. A prefeitura firmou compromisso do Ministério da Educação e do Ministério da Saúde, que ampliaria o número de vagas de residência, com a intenção de acessar Rr$ 108.000,00 mensais, pois isso ajudaria a subsidiar melhorias no hospital.
– Contudo, apesar do hospital relatar a necessidade de melhorias em várias áreas, esse projetos de melhoria não foram formulados e tampouco executados, sob a alegação de outras prioridades.
Contradição 13. A prefeitura firmou compromisso com o Ministério da Educação e o Ministério da Saúde de que não usaria esses Rr$ 108.000,00 mensais para pagar bolsas (conforme explicitado na portaria específica), pois isso ajudaria a subsidiar melhorias no hospital.
– Contudo, a Secretaria Municipal da Saúde afirma que esse dinheiro será usado diretamente para pagar bolsas. Esse dado demonstra absoluto desconhecimento da secretaria sobre os trâmites legais. A secretária não é advogada?
Contradição 14. O número de bolsas alardeado na nota de esclarecimento da prefeitura publicada ontem à noite conta 170 residentes em diversas áreas, dando a impressão de que a supressão de 56 resultaria num impacto pequeno, pois restariam 114 médicos.
– Contudo, a prefeitura, no mínimo, induz ao erro quando emite essa nota. O número de residentes do hospital é de 162, sendo que 20 deles não é de médicos. Além disso, das 142 vagas de residência médica, 117 estão ocupadas. Ao retirarmos 56 médicos, restarão 70 médicos para realizar o atendimento.
Contradição 15. Na nota, a prefeitura diz que a suspensão será de apenas 56 bolsas e que depois tudo voltará ao normal.
– Contudo, ignora-se que:
- a) Sem R1 do primeiro ano em 2016 não haverá R2 em 2017.
- b) Sem R1 do primeiro ano em 2016 não haverá R3 em 2018.
- c) Com o cancelando as matrículas haverá cancelamento imediato de qualquer pleito de formação junto aos Ministérios da Educação e da Saúde.
- d) Com o cancelando as matrículas há risco de cancelamento imediato de qualquer repasse financeiro destinado à residência pelos Ministérios da Educação e da Saúde.
Contradição 16. O prefeito se vangloria de uma gestão baseada em dados técnicos e consulta às equipes da área.
– Contudo, ainda não sabemos quais foram os técnicos do hospital, os assessores jurídicos, os empresários e, principalmente, os médicos que o assessoraram.
Assinado, Sociedade Joinvilense de Medicina