Após a Câmara e o Senado aprovarem a Medida Provisória que altera o Código Florestal (MP 571/12) em setembro, movimentos sociais pedem novamente o veto da presidenta Dilma Rousseff. Em carta encaminhada à Presidência na última terça-feira (9), organizações populares e sindicais afirmam que “da forma como está, o texto protege os latifundiários grileiros e especuladores, que nada produzem sobre a terra”.
No documento, as entidades taxam de “afronta à democracia” a “tentativa do agronegócio de destruir o Código Florestal”. Os movimentos sociais avaliam como única saída o veto da presidenta aos “pontos que privilegiam o agronegócio, em detrimento da sustentabilidade ambiental e da produção, da agricultura familiar e camponesa”.
Assinam a carta a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), entre outros.
O Projeto de Lei que foi aprovado pelo Congresso Nacional em abril teve 12 itens vetados e 32 alterações feitas pelo governo, no mês de maio, por considerar que eles promoviam o desmatamento. Porém, na volta ao Congresso, o texto foi alterado pela bancada ruralista para que retornassem os benefícios aos desmatadores ilegais. Agora, falta apenas a sanção da presidenta Dilma.
Leia a carta na íntegra:
À Excelentíssima Presidenta do Brasil
Senhora Dilma Vana Rousseff
Há três anos a sociedade brasileira vivencia uma das maiores afrontas às conquistas democráticas de nosso país: a tentativa do agronegócio de destruir o Código Florestal, para avançar com seu projeto ambicioso, que visa apenas lucros, promove o desmatamento e intoxica a natureza e os que nela vivem.
Tendo sob seu domínio a grande maioria do Congresso Nacional, por meio da poderosa bancada ruralista, o agronegócio transformou a legislação ambiental em legislação agrícola, voltada para garantir interesses próprios e de grandes proprietários de terra.
A sociedade brasileira, organizada ou não, se manifestou incansavelmente contra os avanços do agronegócio sobre a natureza. Os movimentos sociais do campo e da cidade, a classe artística e parte significativa da classe política também se manifestaram contrariamente às pautas destrutivas do agronegócio, ao mesmo tempo em que defenderam o tratamento diferenciado para a agricultura familiar e camponesa. São os pequenos produtores que alimentam as famílias brasileiras e os que mais preservam o meio ambiente.
Após uma grande mobilização da sociedade brasileira, sensibilizada e ciente da necessidade de tomar decisões firmes, a excelentíssima Presidenta corretamente realizou vetos ao texto ruralista construído no Congresso. Para preencher o lugar dos artigos vetados, que tratavam justamente da recuperação de áreas desmatadas em beiras de rios e nascentes, o Governo Federal enviou ao Congresso Nacional uma Medida Provisória.
Um dos eixos centrais desta MP era o tratamento diferenciado para a pequena propriedade, exigindo que os médios e grandes proprietários deste país recuperem as áreas que desmataram. O texto da MP, no entanto, foi modificado e aprovado na Câmara e no Senado, sob os aplausos veementes dos líderes ruralistas Kátia Abreu e Blario Maggi.
O agronegócio mais uma vez impôs seus interesses à formulação da Lei, estabelecendo que:
– Os benefícios para a pequena propriedade fossem estendidos para a média propriedade, ou seja, até 15 módulos rurais (o que pode chegar a 1.500 hectares). Para esses médios, a área mínima de recuperação passou de 20 metros para apenas 15 metros;
– Para os grandes, a área mínima passou de 30 metros para 20 metros, além de o limite máximo ficar a critério de cada estado. Ou seja, o meio ambiente estará sujeito aos interesses políticos estaduais, mesmo tendo impactos sobre toda a sociedade brasileira;
– Se não bastasse a redução da área a ser recuperada em beiras de rios, o agronegócio também se valeu do benefício concedido aos pequenos produtores de poderem recuperar as áreas com até 50% de espécies frutíferas exóticas e expandiu essa possibilidade para as médias e grandes propriedades. Ou seja, onde deveria haver matas, haverá monocultivos com apelação econômica, ou seja, ao invés dos grandes proprietários de terra serem obrigados a recuperarem o que destruíram, serão beneficiados e certamente voltarão a agredir os remanescentes que sobraram;
– Mesmo com todo o discurso produtivista, o agronegócio retirou do texto a definição de área abandonada, e retirou a restrição para pousio (tempo de descanso da terra entre um cultivo e outro), que era de no máximo 25% da propriedade.
Da forma como está, o texto protege os latifundiários grileiros e especuladores, que nada produzem sobre a terra. As médias propriedades deveriam, sim, ser a extensão máxima permitida para proprietários no país, e estes, que se dizem produtores, são os mesmos que impedem a atualização dos índices de produtividade.
Diante de tamanhos retrocessos, nos direcionamos à Excelentíssima Presidenta reivindicando que mantenha seus compromissos de campanha de não anistiar desmatadores. A sociedade brasileira vê como única alternativa o veto da Presidenta a esses pontos que privilegiam o agronegócio, em detrimento da sustentabilidade ambiental e da produção da agricultura familiar e camponesa. Somente assim a Presidenta estará garantindo a segurança alimentar, a sustentabilidade ambiental e a defesa da democracia brasileira, gravemente ameaçada pelo poderio totalitário do agronegócio.
A sociedade brasileira mais uma vez se manifesta: VETA DILMA!
Assinam este documento:
Central Única dos Trabalhadores – CUT
Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura – CONTAG
Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar – FETRAF
Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra – MST
Movimento de Mulheres Camponesas – MMC
Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
Do Brasil de Fato