Segurança Alimentar: Simpósio defende aprovação de projeto que garante orgânicos na alimentação escolar

Evento reuniu mais de 500  participantes em Florianópolis e debateu questões relacionadas à produção, consumo e publicidade dos alimentos. O apoio à aprovação do projeto de lei que garante o fornecimento de produtos orgânicos à alimentação escolar foi uma das propostas finais do 1º Simpósio de Segurança Alimentar e Nutricional. O evento, realizado no dia 16 de outubro, Dia Mundial da Alimentação, reuniu mais de 500 participantes no auditório da Assembleia Legislativa de Santa Catarina e contou a participação de especialistas, pesquisadores, representantes de movimentos sociais e de entidades ligadas à produção orgânica e alimentação saudável.

“Foi um evento muito rico pela troca de informações. Demos um grande passo para a promoção e construção de políticas públicas que promovam a alimentação saudável e a produção sustentável de alimentos. Santa Catarina precisa de uma política estadual para a alimentação saudável, essa é a mensagem que o simpósio nos deixa”, avalia o deputado Dirceu Dresch (PT), proponente do evento, realizado pela Comissão de Saude.

O deputado também é autor do projeto de lei que determina o percentual mínimo de 20% de alimentos orgânicos, produzidos sem agrotóxicos, na alimentação servida aos alunos da rede pública de ensino. Ele considera que o apoio das entidades ao projeto poderá ajudar a sensibilizar o governo e os demais parlamentares quanto à importância dessa ação. Dresch também é coautor cuja aprovação foi defendida pela simpósio. Trata-se do PL 578/2011, que garante a isenção da cobrança de ICMS dos produtos da agricultura familiar destinados à alimentação escolar e programas públicos.

Alimentação do brasileiro
Estudo divulgado pelo Ministério da Saúde indica que a população brasileira se alimenta de forma inadequada e consome gordura saturada em excesso. Dados revelados pela presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, Maria Emília, mostraram que a obesidade é um problema crescente no país. Segundo o IBGE, 50,1% dos homens brasileiros com mais de 20 anos estão acima do peso. Entre as mulheres, o índice é de 48%. Dados mostram o elevado índice de obesidade na adolescência, com taxas que praticamente igualam-se às do México e dos Estados Unidos. Os biscoitos e refrigerantes são grandes vilões. “Infelizmente, o aumento da renda propiciou aumento do consumo de alimentos pobres em nutrientes e prejudiciais à saúde”, opina Dresch.

Propaganda de alimentos
Dados apresentados pela pesquisadora Renata Alves Monteiro, da Universidade de Brasília (UnB),  mostram que a publicidade dos alimentos precisa de uma regulamentação mais adequada para evitar abusos. “A TV virou a babá das crianças. Elas ficam expostas, em média, cinco horas por dia na frente da televisão e 97% da propaganda de alimentos TV apresentam produtos não-saudáveis. Há  uma indústria bilionária que sabe disso e investe pesadamente no desenvolvimento de estratégias de publicidade para que as crianças sejam doutrinadas a pedir, de forma persistente, aos seus pais, que comprem determinado alimento”, disse a pesquisadora. A criança não tem condição de avaliar o que é certo, ou se o valor passado pela propaganda é correto. A publicidade explora isso e transforma a vida dos pais num pesadelo.

“Nas gôndolas dos supermercados, as guloseimas, biscoitos recheados, balas, etc. são colocadas na altura das mãos das crianças. Por que não fazem isso com as frutas? Os pais têm responsabilidade para impor os limites, mas a indústria também tem a sua responsabilidade”, argumentou Renata.

Agrotóxicos
“O Brasil é hoje o maior mercado doméstico de agrotóxicos do mundo e usa cerca de 20% do veneno produzido. Cada brasileiro consome em média 5,2 quilos de agrotóxicos por ano, conforme os dados revelados no simpósio. A presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional discute um plano de redução do uso de agrotóxicos. O órgão propõe a suspensão da pulverização aérea do veneno, o banimento de produtos que já estão proibidos em outros países e a retirada das subvenções concedidas aos produtores de agrotóxicos.

“É um absurdo, mas o governo de Santa catarina, para o ano de 2013, prevê um subsídio de R$ 278,7 milhões para insumos, incluindo sementes transgênicas e agrotóxicos”, critica Dresch. Ele comenta ainda que o programa Troca-Troca de sementes do governo do Estado distribui sementes geneticamente modificadas. “Devemos reverter esses valores e estimular a produção agroecológica e orgânica. O Estdo está premiando quem usa agrotóxico e não dá nenhum incentivo à produção limpa.”

Política de apoio
Santa Catairna tem mais de 3 mil agricultores familiares. Dresch vislumbra uma grande oportunidade de, por intermédio da agricultura familiar, oferecer um produto de qualidade, que de fato traga saúde e qualidade de vida às pessoas. Ele propõe que o Estado realize ações voltadas à educação alimentar e  ao fomento da produção saudável. “Devemos criar uma política de estímulo à produção de alimentos agroecológicos e orgânicos, comprometendo as estruturas de governo a executá-la. Hoje, a Epagri e a Cidasc pouco fazem nessa área. Há denúncias de que os técnicos são pressionados a desestimular a produção sem agrotóxicos e livre de transgênicos”, aponta o parlamentar.

Mundo precisa de agricultura inteligente para conseguir alimentar a população, alerta estudo

Um relatório divulgado nesta quarta-feira pela Comissão de Agricultura Sustentável e Mudança Climática, formada por cientistas de diferentes países, afirma que são necessárias grandes mudanças na agricultura e no consumo de alimentos no mundo todo para que gerações futuras consigam se alimentar.

A Comissão de Agricultura Sustentável e Mudança Climática passou mais de um ano avaliando dados enviados por cientistas e responsáveis pela elaboração de políticas alimentares. De acordo com o documento publicado pela comissão, o setor agrícola precisa intensificar a sustentabilidade, diminuir o desperdício e reduzir as emissões de gases de efeito estufa das fazendas.

A comissão foi presidida pelo professor John Beddington, o conselheiro científico mais importante do governo da Grã-Bretanha. “Se você vai gerar alimentos o bastante para enfrentar a pobreza de 1 bilhão de pessoas que não conseguem o alimento necessário, imagine com outro bilhão (de aumento na população global) dentro de 13 anos. Você vai precisar aumentar muito a produção agrícola”, disse Beddington à BBC.

“Você não pode fazer isto usando as mesmas técnicas agrícolas que usamos antes, pois isto iria aumentar muito as emissões de gases de efeito estufa no mundo todo”, acrescentou. A atividade agrícola é considerada como provavelmente responsável por cerca de um terço das emissões globais de gases de efeito estufa, apesar de os números ainda serem indefinidos, pois uma grande proporção destes números é relativa à desmatamento com a limpeza de florestas para a criação de áreas cultiváveis e é muito difícil medir as emissões nestes casos.

E, apesar de haver variações regionais, as previsões são de que a mudança climática reduza a produção agrícola. No caso do sul da Ásia, esta redução será dramática. Estudos sugerem que a produção de trigo pode cair pela metade em 50 anos. “Precisamos desenvolver uma agricultura que seja inteligente em relação ao clima – gerando mais produção sem as emissões de gases de efeito estufa”, afirmou Beddington.

Técnicas variáveis
A comissão foi estabelecida pelo Grupo Internacional de Consulta em Pesquisa Agrícola (CGIAR, na sigla em inglês), a rede global de instituições que trabalham com questões alimentares e de pobreza. O relatório final da comissão foi divulgado na conferência Planet Under Pressure (Planeta Sob Pressão, em tradução livre), que ocorre em Londres.

A conferência de quatro dias promove o encontro de acadêmicos, ativistas e empresários para divulgar informações sobre políticas ambientais antes da conferência Rio+20, que ocorre em junho. Segundo Christine Negra, coordenadora do trabalho da comissão, as técnicas para renovação da atividade agrícola variam de acordo com as regiões. “Em lugares onde o uso de métodos orgânicos, por exemplo, é apropriado ou economicamente vantajoso e produz bons resultados sócio-econômicos e ecológicos, esta será uma ótima abordagem”, disse.

“Em lugares onde, com o uso de organismos geneticamente modificados você possa enfrentar os desafios da segurança alimentar e questões sócio-econômicas, então estas serão as abordagens corretas, uma vez que seja provado que são seguras.” A comissão também recomenda mudanças no sistema político e econômico em torno da produção e consumo de alimentos para encorajar a sustentabilidade, aumentar a produção e diminuir os impactos ambientais. Agricultores precisam de mais investimentos e informações, e governos precisam colocar a agricultura sustentável no centro das políticas nacionais, segundo o relatório.

Modelos existentes
Segundo o professor Tekalign Mamo, consultor do Ministério da Agricultura na Etiópia, os modelos para muitas das transformações necessárias já existem. Um destes modelos, destacados no relatório, é o Programa de Segurança Produtiva da Etiópia, que começou em 2003 com a participação do governo e parceiros internacionais.

Mamo afirma que um dos aspectos destes modelos é que “é preciso conseguir bens domésticos, para que as pessoas não gastem todos os recursos em tempos de escassez crônica de alimentos”. “Outro é trabalhar em bens da comunidade, como construção de (dispositivos) de irrigação de pequena escala (…); as comunidades são donas destas atividades e também designam o trabalho livre, e o governo fornece incentivos como alimentos ou dinheiro para os que participam”, afirmou.

O professor afirma que este modelo já tirou “1,3 milhão da população da pobreza e (levou para a situação de) segurança alimentar. E, ao mesmo tempo, também conservou e recuperou o meio ambiente”. O relatório também destacou outros projetos como a garantia na Índia de emprego nas áreas rurais ou as medidas para garantir a propriedade da terra para mulheres em países africanos.

Mas, o documento também recomenda mudanças na política agrícola de países desenvolvidos e cita como exemplo a questão do desperdício de alimentos. “Se desperdiçarmos menos alimentos, teremos que produzir menos e menos gases de efeito estufa serão emitidos”, disse Christine Negra.

Da BBC News