O departamento jurídico do Sindicato dos Mecânicos não tem um minuto de descanso desde que a crise da Busscar Ônibus iniciou. Desde a ação coletiva para pagamento dos salários atrasados, que agora vão completar dois anos, ou 24 meses sem que a empresa se envergonhe do não pagamento de salários a seus trabalhadores, e depois com as 2.214 ações individuais para pagamento das verbas rescisórias – também não pagas, por sinal – a luta é para garantir os direitos de quem já foi enganado e é injustiçado por tantas manobras.
Agora o departamento jurídico cumpre mais um passo nesse tortuoso processo da recuperação judicial da Busscar: impugnou a nova lista de credores publicada recentemente em jornal de circulação l0cal. Apesar de existir um Instituto nomeado pela Justiça, os erros persistem, e são graves. Há casos em que os valores dos trabalhadores estão pela metade. Em outros, sequer o nome aparece, mesmo que já tenham seus processos transitados em julgado.
Segundo a advogada Luiza De Bastiani, o Sindicato impugnou tudo novamente por conta dessas falhas enormes, a falta de todos os valores finalizados e calculados na Justiça do Trabalho, entre outros. “Buscamos garantir que a execução integral das ações esteja prevista na ação de recuperação judicial, ou seja, que o Juiz considere que há valores em aberto para futuro, e também assim há transparência para o caso de existir algum comprador para essa empresa falimentar, para que não tenham surpresas depois”, explica Luiza.
Nova proposta do Sindicato já em mãos da empresa. Justiça vai receber também
O Sindicato dos Mecânicos também já reuniu a comissão de trabalhadores formada após a realização das três grandes reuniões com os trabalhadores lesados pela Busscar. Além de debater as ações que serão feitas daqui até a assembleia geral dos credores, a comissão e o Sindicato definiram entregar a contraproposta aprovada nas reuniões diretamente à empresa.
“Já entregamos a contraproposta na Busscar, para que eles não aleguem depois que não sabiam, nunca foram avisados, e todas as baboseiras que todos conhecem. Agora, se quiserem realmente negociar, mudar radicalmente esse plano que apresentaram, ainda há tempo. Depois pode ser tarde demais”, revela o presidente Evangelista dos Santos.
A mesma contraproposta aprovada pelas reuniões dos trabalhadores, via Sindicato dos Mecânicos, também será protocolada na Justiça para juntada ao processo de recuperação judicial em questão, para que fique mais uma vez demonstrada a lisura e a responsabilidade com que os trabalhadores vem tratando a questão, diferente das atitudes e ações da Busscar. Não há data definida para que isso aconteça.
Apropriação indébita, dupla ilegalidade
Também no ato das impugnações a essa nova lista apresentada pelo administrador judicial e Busscar, novamente fraude à lei é o que se vê no que se refere à dívida com o Sindicato dos Mecânicos. Até o dia 31 de outubro, quando conseguiram a saída da Recuperação Judicial, a Busscar devia à entidade sindical quase R$ 1,4 milhão, ou seja, um milhão e quatrocentos mil reais.
Esse valor corresponde a mensalidades, imposto sindical, convênios e benefícios, e note-se, a dívida vem desde 2009. Ou seja, antes do início da grande crise de 2010 que se arrasta até agora. Não bastasse isso, descontar da folha de pagamento dos trabalhadores – crime um – e não repassar ao Sindicato que é quem paga os convênios e benefícios – crime dois – a empresa consegue que o administrador judicial coloque a dívida não como trabalhista, e sim como quirografãria!
Um débito claro, cristalino e com origem sim de crédito trabalhista, ou seja, que deve estar na classe um dos credores, foi colocado como sem garantias reais – pasmem – apesar de claramente ser oriundos de verbas trabalhistas, e imposto sindical, previsto em lei. “Esperamos que também neste caso haja justiça”, destaca o presidente Evangelista dos Santos, que acredita na mudança de quadro de credores, qualificando o débito como trabalhista.
Recuperação Judicial não é cumprida
Outra medida que o Sindicato decidiu tomar é cobrar a apresentação da prestação de contas desde que foi decretada a recuperação judicial da empresa em 31 de outubro de 2011. Desde então a Justiça liberou – completamente fora do que prevê a Lei de Falências – um terreno que rendeu R$ 7 milhões à empresa, e que dizem, foi utilizado para produzir ônibus – não se sabem nem quantos, nem quando foram feitos, e tampouco quanto “renderam” de lucros.
“Onde estão os recursos desta liberação do terreno? Pagaram salários? Pagaram FGTS, INSS, impostos? Queremos saber em nome dos trabalhadores que não recebem nada há dois anos”, cobra o presidente Evangelista. Quem têm de dar satisfações é o administrador judicial e a empresa, de forma urgente.
“Desde novembro, então, como prevê a Lei, a Busscar paralisou as dívidas que tinha até 31 de outubro, e teria que manter salários e todas as outras obrigações em dia. Ou então paralisar a fábrica para não gerar mais passivo. Se não estiver cumprindo a lei, não existe nenhuma recuperação em andamento”, critica Evangelista.
O Sindicato vai aguardar os dados para decidir novos passos, sempre na luta para que os direitos dos trabalhadores sejam resguardados. “Como já dissemos, queremos a empresa recuperada, mas com novos sócios, investidores e dinheiro novo, novas práticas de gestão que deem sustentabilidade ao negócio, aos empregos. Desse jeito que aí está não há credibilidade alguma”, afirma o presidente.
Assembleia Geral dos Trabalhadores no dia 15 de abril
Com tantas atividades em andamento, o Sindicato pretende também conversar com o Ministério do Trabalho, e Ministério Público do Trabalho em relação a essas atitudes. A intenção é se cercar de todas as garantias possíveis para os trabalhadores.
Por outro lado, a diretoria trabalha também junto com a comissão de trabalhadores para que todos os trabalhadores com algum processo, ou ainda ligados à Busscar, compareçam na grande Assembleia Geral dos Trabalhadores prevista para o dia 15 de abril, um domingo, às 9 horas no Centro Esportivo do Sindicato, localizado na rua Rui Barbosa, 495 no bairro Costa e Silva.
Nesta Assembleia os trabalhadores vão discutir, debater e aprovar a forma que o Sindicato vai representa-los na assembleia geral dos credores, inclusive com a possível votação em nome dos trabalhadores com procurações delegadas à entidade, revela o departamento jurídico. “Queremos todos os trabalhadores na nossa grande assembleia geral dia 15 de abril, e depois, todos também na assembleia geral dos credores. Que fique claro aos trabalhadores: quem estiver presente vai votar, e decidir, por todos! Depois não adianta chorar, é hora de participar”, avisa o presidente Evangelista dos Santos.
Toda uma programação está sendo montada especialmente para esse dia, e também até o dia da grande assembleia geral dos credores, que o Sindicato contesta e vai contestar até o fim para que seja feita em local neutro, e com votação secreta por cédulas, evitando fraudes e confusões. O Sindicato também pede a todos os trabalhadores com processos, ou não, para que se cadastrem no site para receber informações por boletim eletrônico, e informem seus emails pessoais para a o departamento jurídico via fone ou mesmo email para juridico@sindmecanicos.org.br.
Para ainda manter clara a contraproposta que foi construida pelos trabalhadores nas três grandes reuniões, segue abaixo ela na íntegra. Logo depois seguem também os 20 motivos que levaram ao Sindicato pedir a impugnação do Plano de Recuperação Judicial que a Busscar apresentou. Confiram:
Abaixo segue a proposta do Sindicato dos Mecânicos e trabalhadores:
1 – Garantir o pagamento integral de todos os créditos, sem descontos
2 – Dar tratamento igual a todos os trabalhadores quanto ao valor e critério de pagamentos
3 – Pagamento de 50% do valor devido em até 30 dias após a possível aprovação do Plano; os 50% restantes em 12 parcelas, com correção, como manda a lei de recuperação.
4 – Garantir que o patrimônio do Grupo Busscar e de acionistas não seja vendido ou liberado até que estejam pagas todas as dívidas trabalhistas
5 – Criação do Conselho de Administração da empresa com a inclusão de representantes dos trabalhadores e do Sindicato, com poder de voto e veto
6 – Realização da assembleia geral de credores em local neutro, e jamais nas dependências da empresa, afinal ela é ré no processo
7 – Votação deve ser realizada de forma secreta, em cédulas, e com fiscalização rígida. Processo eletrônico é falível e suspeito por não ser auditado, nem conhecido
Sobre a impugnação ao Plano de Recuperação Judicial da Busscar, veja abaixo quais os itens que derrubam e mostram a fraqueza e inviabilidade do mesmo:
São 20 objeções divididas em duas impugnações que em resumo, apresentam o seguinte:
a) Não há menção de saída da família Nielsen da administração da sociedade;
b) Plano de alcançar boas margens (24,7% em 2014) deve estar atrelado à pratica de preços do mercado. Ocorre que o plano desconsidera o fato de que o produto está desatualizado e que o market share perdido já foi ocupado por concorrentes;
c) Plano baseado em operação com a Guatemala, o qual não tem perspectiva imediata de retomada dos embarques, a curto prazo. No plano esta operação representa mais de 70% da produção de 2012;
d) Credores são novamente convidados a bancar a operação com descontos, carências e taxas de juros subsidiadas, que reduzem seu crédito para até 15% do valor de face (aplicando-se o ajuste a valor presente);
e) O plano concede tratamento diferenciado para credores de mesma classe;
f) O plano de pagamento aos credores trabalhistas em prazo superior a 1 ano, em violação ao art. 54 da Lei de Falências;
g) Não há plano para pagamento da dívida tributária, na monta de aproximadamente R$ 477 milhões, sendo que os programas de parcelamento do Governo se estendem a no máximo 60 meses, gerando um comprometimento de receita mensal superior a R$ 5 milhões;
h) A administração da sociedade ainda acredita na obtenção do crédito prêmio de IPI em relação às exportações após 1990, ainda que em descompasso com inúmeras decisões judiciais, inclusive do STF;
i) Com a aprovação do plano, a Administração ficará autorizada a vender ativos (imóveis, Tecnofibras, etc) que hoje são a garantia dos credores;
j) Mantendo o mesmo estilo de gestão do passado, a empresa não alcançará as margens planejadas, e consumirá o capital de giro eventualmente aportado ou obtido com as alienações;
k) A situação ficará pior que está atualmente, pois não mais se terá os ativos para garantia do pagamento dos débitos;
l) Na realidade, serão os mesmos atores, no mesmo cenário, realizando as mesmas ações, bancados pelos credores, que ao final, além de não receberem seus créditos, estarão sem bens passíveis de garantí-los;
Do Sindicato dos Mecânicos