STF, Congresso e Mensalão

Já faz algum tempo acompanho essa criação midiática chamada “mensalão”. Digo midiática porque entendo do riscado, pois atuo na área há mais de 20 anos. E mais ou menos o mesmo tempo trabalhei em política, e portanto, conheço bem os bastidores tanto do Executivo quanto do Legislativo. Do Judiciário entendo bem por vivência própria. E agora resolvo dar meu pitaco aqui no Palavra Livre.

Em primeiro lugar, se houve mensalão no governo do presidente Lula, do PT, então houve mensalão desde que aqui se instalou a República. Não há governo que não coopte parlamentares em algumas situações, ou para governar, ou para garantir apoio de votos a projetos importantes. Quando a mídia tenta impingir uma história a um partido, o faz de caso pensado. O faz com interesses outros que jamais irá confessar. Aí você vai me dizer: mas não és jornalista, atua nos meios? Sim, sou e trabalho sim, mas sei bem o que é liberdade de imprensa, liberdade de expressão, e liberdade dos “donos da imprensa”, essa última sim vale forte, e mais que outras.

Esse caso “mensalão”, conforme tentam fazer ao povo brasileiro crer, não passa de financiamento de partidos políticos para manter composição de governo. Somente isso. É ilegal, claro que é! Mas é o que fizeram, fazem e farão todos os partidos para lutar pelo poder em base municipal, estadual e federal. Mas o Brasil é hipócrita, finge que acredita, fala de corrupção ao mesmo tempo que se ocupa de pedir um “favorzinho” a esse ou aquele político. Portanto, o STF julgou uma coisa que não existe. Porque se existisse “mensalão” para votar todos os projetos de interesse do governo, esse país teria mudado muito mais rápido. E não é isso que vimos.

Agora, após fazer o serviço pedido pela mídia, os barões da mídia conservadora, o STF resolve também investir nas prerrogativas do outro poder, o legislativo! Além de julgar algo com olhos vesgos, ou míopes, nossos ministros de toga querem também cassar mandatos contra o que diz a Constituição Federal. E mais que isso, cria um impasse perigoso, institucional, que pode – esse sim – causar danos à democracia. Democracia essa tão jovem, tão frágil ainda. A quem interessa esse embate institucional?

Quem conhece um pouco da história brasileira, principalmente a política, saberá do que falo agora. Getúlio Vargas foi tão açoitado, tão agredido pelos meios de comunicação conservadores lá pelos idos da década de 1950, que chegou a cometer o suicídio. O que desejavam Carlos Lacerda, jornalista e deputado, e setores militares, das forças armadas? Tomar o poder para “enfrentar o comunismo”. Mesmo com a morte do pai dos pobres, não conseguiram.

Juscelino Kubitschek de Oliveira, o JK, então governador de Minas, se lança na disputa pela Presidência da República. É atacado, denunciado, agredido até em seus atos pessoais. Eleito pelo voto direto e soberano dos brasileiros, eis que a velha mídia ataca, junto com Lacerda e setores das forças armadas para impedir sua campanha, sua vitória, sua posse e até seu governo! O mantra repetido era “JK não pode concorrer. Se concorrer, não pode vencer. Se vencer, não pode tomar posse. Se tomar posse, não pode governar”. Assim foi todo o seu governo, com a mídia conservadora o atacando. Só não conseguiram o impedir de construir Brasília.

Depois, as mesmas criações de fatos levaram nosso país à ditadura tão desejada. Igreja e mídia se uniram para derrotar comunismo, e colocaram o Brasil nas mãos dos militares durante mais de 20 anos. Perseguições, torturas, cassações, fim das liberdades, mortes, desaparecimentos, fase das mais brutais da nossa história. Nesse período houve também corrupção, negociatas, obras gigantescas a preços inimagináveis. Mas ninguém podia falar, e a mídia conservadora manteve tudo por debaixo de panos quentes. Voltamos à democracia com muita luta de gente guerreira, alguns morreram, outros sofreram horrores para que hoje possamos nos manifestar livremente, mesmo que com algumas censuras…

Collor, Itamar Franco, FHC – este o queridinho da mídia… – Lula, Lula, Dilma. O primeiro foi cassado por corrupção – será que foi por isso mesmo? – Itamar era o inconsequente, solteiro, etc. Mas lançou FHC, que virou pai do Plano Real, pai das privatizações que deixaram o país sem soberania de suas terras, bens, pai da compra de votos para a reeleição… mas isso não interessa para a grande mídia. O príncipe foi o “must” para esses senhores. Veio Lula, operário, ex-metalúrgico. Não sabe falar, não sabe nada, pensavam. Eis que Lula ganha as eleições, não sem antes acertar ponteiros com o mercado, claro…

E o metalúrgico governa para os mais pobres. Dá recursos aos miseráveis, cria universidades, retoma o crescimento econômico, inclui milhões de brasileiros com programas sociais. Se reelege contra a mídia conservadora, e ainda faz a sucessora. Dilma. Ex-guerrilheira, etc. Esta, governa ainda melhor diante da crise. Já se avizinha a reeleição da mulher, para desespero de neoliberais. E o pior acontece: Haddad vence Serra na maior cidade brasileira, São Paulo. E agora?

Agora, vamos amplificar o mensalão, condenar duramente, cassar, vamos também pegar o Lula com a delação premiada do Marcos Valério (homem de crédito não é?) e… o que pode vir depois? Esse filme já foi visto antes. E com a anuência do STF pela força militar. Agora, outros tempos, internet, comunicação democratizando cada vez mais, que tal mostrar que a democracia cria corruptos, e quem está no governo é o grupo mais corrupto da história brasileira, e precisamos “limpar” o país? Que tal?

Amigos, sei que crio polêmica com esse post mal escrito, mas é claro o interesse de grupos gigantes da especulação, do neoliberalismo, da mídia conservadora que monopoliza os meios nas mãos de poucos. Esses movimentos que parecem tão singelos, e tão patrióticos são na verdade incitações perigosas para a democracia. O STF tem o dever de guardar a Constituição Federal, e não se impor a ela. Julgaram, condenaram? Feito o serviço! Cassações de mandatos, deixem com o Congresso Nacional, a sabedoria manda isso.

Ditaduras iniciaram assim como vemos agora. Será que queremos isso novamente no Brasil? Eu não, e você?

Ditadura Militar: novo movimento inicia ações contra acusados de torturas

Às vésperas de mais um aniversário do golpe de Estado que mergulhou o Brasil em uma ditadura militar de 20 anos, um novo movimento chega às ruas do país, nesta segunda-feira, com o objetivo de promover a denúncia dos acusados de cometer tortura contra prisioneiros políticos durante o período ditatorial. O Levante Popular da Juventude (LPJ) realizou, nesta manhã, em várias capitais brasileiras, “ações simultâneas de denúncia de diversos torturadores, que continuam impunes”, afirma o manifesto liberado junto com o ato político.

Os ativistas apoiam a Comissão da Verdade e exigem a apuração e a punição sobre os crimes cometidos pela ditadura militar. O caráter das ações, conhecida como “escracho”, baseia-se em ações similares as que acontecem na Argentina e no Chile, em que jovens fazem atos de denuncias e revelações dos torturadores que continuam soltos e sem julgamento sobre suas ações durante a ditadura militar.

Em Belo Horizonte, às 6h da manhã, cerca de 70 pessoas realizaram um “escracho” em frente a casa do acusado Ariovaldo da Hora e Silva, no bairro da Graça, uma área residencial da capital mineira. A manifestação contou com faixas, cartazes e tambores, além da distribuição de cópias de documentos oficiais do DOPS, contendo relatos das sessões de tortura com a participação do acusado, “para conscientizar a população vizinha ao criminoso”, disse um porta-voz do movimento. Os vizinhos se mostraram surpresos com o fato do Ariovaldo ter sido torturador do Regime Militar.

– Não sabia que o Seu Ari era um torturador. Tenho na família um caso de perseguido pela ditadura e vou divulgar isso – afirmou um morador da região.

O denunciado permaneceu em casa ouvindo e assistindo a manifestação, tendo aparecido na janela por alguns segundos.

Quem é quem

Ariovaldo da Hora e Silva foi investigador da Polícia Federal, lotado na Delegacia de Vigilância Social como escrivão. Delegado da Polícia Civil durante a ditadura, exerceu atividades no Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) entre 1969 e 1971, em Minas Gerais. O nome de Ariovaldo da Hora e Silva consta na obra Brasil Nunca Mais (Projeto A), acusado de envolvimento com a morte de João Lucas Alves e de ter praticado tortura contra presos políticos.

“Foram vítimas dele Jaime de Almeida, Afonso Celso Lana Leite e Nilo Sérgio Menezes Macedo, entre outros. Na primeira comissão constituída para tratar do recolhimento dos documentos do DOPS ao Arquivo Público Mineiro (APM), em 1991, ele foi designado para representar a Secretaria da Segurança Pública do Estado de Minas Gerais (SESP). Em 1998, foi Coordenador de Informações da Coordenação Geral de Segurança (COSEG)”, relata o texto distribuído nesta manhã.

Já o Levante Popular da Juventude é um “movimento social organizado por jovens que visa contribuir para a criação de um projeto popular para o Brasil, construído pelo povo e para o povo”, acrescenta o texto. O LPJ, segundo seus ativistas, não é ligado a partidos políticos: “Com caráter nacional, tem atuação em todos os Estados do país, no meio urbano e no campo. Se propõe a articular jovens, militantes de outros movimentos ou não, interessados em discutir as questões sociais e colaborar para a organização popular. Tem como objetivo propiciar que a juventude tome consciência da sua história e da realidade à sua volta para transformá-la”.

Um dos propósitos do LPJ é o de organizar a juventude para fazer denúncias à sociedade, por meio de ações de Agitação e Propaganda. “Não há bandeiras previamente definidas. A luta política se dá pelas pautas escolhidas pelos próprios militantes, que realizam atividades de estudo e debates, sistematicamente, por todo o país”, continuou.

Manifesto

Os rebelados do Levante também divulgaram, logo após as ações desta manhã, um manifesto no qual situam o objetivo da luta iniciada com o ‘escracho’ ao acusado de torturar presos políticos no país. Leia, na íntegra o Manifesto Levante Contra Tortura:

Mas ninguém se rendeu ao sono.
Todos sabem (e isso nos deixa vivos):
a noite que abriga os carrascos,
abriga também os rebelados.
Em algum lugar, não sei onde,
numa casa de subúrbios,
no porão de alguma fábrica
se traçam planos de revolta.

Pedro Tierra

Saímos às ruas hoje para resgatar a história do nosso povo e do nosso país. Lembramos da parte talvez mais sombria da história do Brasil, e que parece ser
propositadamente esquecida: a Ditadura Militar. Um período onde jovens como nós, mulheres, homens, trabalhadores, estudantes, foram proibidos de lutar por uma vida melhor, foram proibidos de sonhar. Foram esmagados por uma ditadura que cruelmente perseguiu, prendeu, torturou e exterminou toda uma geração que ousou se levantar.

Não deixaremos que a história seja omitida, apaziguada ou relativizada por quem quer que seja. A história dos que foram assassinados e torturados porque acreditavam ser possível construir uma sociedade mais justa é também a nossa história. Nós somos seu povo. A mesma força que matou e torturou durante a ditadura hoje mata e tortura a juventude negra e pobre. Não aceitamos que nos torturem, que nos silenciem, nem que enterrem nossa memória. Não esqueceremos de toda a barbárie cometida.

Temos a disposição de contar a história dos que caíram e é necessário expor e julgar aqueles que torturaram e assassinaram nosso povo e nossos sonhos. Torturadores e apoiadores da ditadura militar: vocês não foram absolvidos! Não podemos aceitar que vocês vivam suas vidas como se nada tivesse acontecido enquanto, do nosso lado, o que resta são silêncio, saudades e a loucura provocada pela tortura. Nós acreditamos na justiça e não temos medo de denunciar os verdadeiros responsáveis por tanta dor e sofrimento.

Convidamos a juventude e toda a sociedade para se posicionar em defesa da Comissão Nacional da Verdade e contra os torturadores, que hoje denunciamos e que vivem escondidos e impunes e seguem ameaçando a liberdade do povo. Até que todos os torturadores sejam julgados, não esqueceremos, nem descansaremos.

Pela memória, verdade e justiça!

Levante Popular da Juventude

Do Correio do Brasil