Trabalho escravo: Supremo transforma senador em réu

Por sete votos a três, o Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou a denúncia do Ministério Público Federal e transformou em réu por trabalho escravo o senador João Ribeiro (PR-TO). Ele é acusado, desde 2004, de manter 35 trabalhadores em condições análogas à escravidão em uma fazenda de sua propriedade no interior do Pará. Entre eles, havia duas mulheres e um menor de 18 anos.

Votaram contra o recebimento da denúncia os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello. Gilmar apresentou voto rebatendo a acusação de trabalho escravo e divergindo da relatora do caso, a ex-ministra Ellen Gracie.  Segundo ele, a precariedade das condições às quais os trabalhadores rurais estavam submetidos é comum à maioria dos brasileiros e, por isso, não deveria ser criminalizada.

“A inexistência de refeitórios, chuveiros, banheiros, pisos em cimento, rede de saneamento, coleta de lixo é deficiência estrutural básica que assola de forma vergonhosa grande parte da população brasileira, mas o exercício de atividades sob essas condições que refletem padrões deploráveis e abaixo da linha da pobreza não pode ser considerado ilícito penal, sob pena de estarmos criminalizando a nossa própria deficiência”, disse o ministro.

O julgamento do caso foi interrompido a pedido de Gilmar Mendes em outubro de 2010, quando Ellen Gracie apresentou seu voto a favor do recebimento da denúncia. O ministro pediu mais tempo para analisar os autos. O processo ficou um ano e dois meses parado no gabinete de Gilmar. Para ele, não houve coação, ameaça ou imposição de jornada excessiva. “Todos podiam exercer o direito de ir e vir”, disse o ministro.

Servidão por dívidaNão foi essa, porém, a opinião da maioria de seus colegas nem da ex-ministra Ellen Gracie. Na avaliação da relatora, as provas reunidas na fase preliminar de investigação (inquérito) comprometem o senador ao apontar para um quadro de condições degradantes, jornada exaustiva, restrição de locomoção, servidão por dívida e falta de cumprimento de promessas salariais e obrigações trabalhistas.

Um cenário que, segundo ela, pode ficar ainda mais claro com a continuidade das apurações por meio da ação penal. A ex-ministra apresentou seu relatório apenas quatro dias após João Ribeiro ter renovado seu mandato no Senado por mais oito anos, graças aos 375 mil votos recebidos. A investigação chegou ao Supremo em 22 de junho de 2004. Ou seja, há sete anos e oito meses. Outros dois parlamentares também respondem por trabalho escravo no Supremo: os deputados Beto Mansur (PP-SP) e João Lyra (PTB-AL).

Multa trabalhista
Em dezembro de 2010, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) confirmou o entendimento de que houve trabalho escravo, mantendo a multa de R$ 76 mil imposta a João Ribeiro em instância inferior. Em pronunciamento feito no Senado em 2005, ele reconheceu não ter cumprido obrigações trabalhistas, mas afirmou que ser acusado de trabalho escravo era “muito forte”.

Na defesa entregue ao STF, João Ribeiro alega que o processo não poderia avançar no STF enquanto não fosse julgado o recurso apresentado por ele contra a inspeção feita pelo Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo em sua propriedade. Ele nega a acusação e diz que não pode ser responsabilizado por eventuais problemas trabalhistas ocorridos em sua fazenda.
Rancho sobre brejo
Em fevereiro de 2004, integrantes do Grupo Móvel resgataram 35 trabalhadores da Fazenda Ouro Verde, de 1,7 mil hectares. A propriedade do senador está localizada no município de Piçarra, no Sudeste do Pará, na divisa com o Tocantins, a 555 km de Belém. Formada por representantes do Ministério do Trabalho, do Ministério Público do Trabalho e da Polícia Federal, a equipe aplicou 25 autos de infração. As rescisões contratuais custaram na época R$ 64 mil a João Ribeiro.

Os alojamentos eram ranchos improvisados, sem paredes e de chão batido, feitos por folhas de palmeiras e sustentados por arbustos fincados no solo. Um dos ranchos, segundo a denúncia, havia sido erguido sobre um brejo, cujas poças provocavam umidade excessiva e cheiro insuportável. Não existia banheiro. Os trabalhadores tinham de fazer suas necessidades fisiológicas ao relento.

Água insalubre e jornada exaustiva
Também não havia cama ou colchão. Cada um tinha de levar de casa a própria rede para repousar. Tampouco havia cozinha, de acordo com os fiscais. Para almoçar ou jantar, os trabalhadores tinham de se sentar sobre pedras e restos de árvores ou sobre o próprio chão. A refeição era composta basicamente por arroz, feijão e, eventualmente, carne, sem verdura, conforme o relato da fiscalização.

A água consumida era insalubre e vinha de três fontes – um brejo lamacento, uma cacimba rústica e uma represa. A mesma fonte de água era usada pelos trabalhadores para matar a sede, lavar suas roupas e louças, tomar banho e escovar os dentes, diz o relatório.
As jornadas de trabalho eram consideradas exaustivas. Estendiam-se por até 12 horas diárias de segunda a sábado. No domingo, seguiam por seis horas, sem qualquer observância de folga semanal.

De acordo com os auditores, os trabalhadores podiam aparentemente exercer o direito de ir e vir. Mas, segundo os fiscais, esse direito era desrespeitado de forma disfarçada, por meio da retenção de salários. Ainda de acordo com a denúncia, os trabalhadores eram contratados de maneira informal.

Do Brasil de Fato

Trabalho escravo: MTE faz flagrante em obra de shopping

Em operação de fiscalização do trabalho na zona sul de Recife, iniciada dia 13 deste mês, uma equipe de auditores fiscais do trabalho da SRTE/PE, resgatou seis trabalhadores em situação análoga à de escravo, que haviam sido arregimentados pela empresa Mastel Montagem de Estruturas Metálicas Ltda. nos estados de Minas Gerais, Piauí, e Paraná. Eles eram empregados nas obras de construção do Shopping Riomar, um dos empreendimentos do Grupo JCPM em Pernambuco. No canteiro de obras estão em atividade aproximadamente 2.200 trabalhadores, sendo 1.000 deles terceirizados e/ou “quarteirizados”. A equipe é coordenada pelo auditor Carlos Silva, em conjunto com a procuradora do Trabalho, Débora Tito.

A MASTEL é uma das “quarteirizadas” em atividade nesse canteiro de obras. Os empregados foram alojados em condições precárias, alguns sem salário por aproximadamente quarenta dias e com Carteira de Trabalho retida na sede da empresa, que fica no Paraná. Não dispunham de água potável para beber, de roupas de cama, além de dormirem sobre colchões sujos e até mofados diretamente sobre o chão. Nenhuma medida de higiene e limpeza foi observada no local, onde a empresa não fornecia sequer papel higiênico. Parte dos trabalhadores está nesta condição desde novembro/2011 e outra desde janeiro deste ano.

Segundo o coordenador, a empresa deixou de cumprir com várias obrigações legais, dentre elas a de garantir condições dignas de alojamento e de trabalho para seus trabalhadores, com alojamentos adequados, conforme Norma Regulamentadora nº 18, além de oferecer condições de trabalho seguras, qualificando seus empregados para a prevenção de acidentes e doenças diante dos riscos da atividade. Os trabalhadores denunciam que chegaram  a comer até mesmo macarrão e feijão azedos nas refeições oferecidas pela empresa. Ainda segundo Carlos Silva, a empresa deixou de emitir Certidão Declaratória de Transporte de Trabalhadores Urbanos, medida utilizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego para combater o aliciamento de mão de obra.

A equipe de fiscalização embargou totalmente a obra do Shopping Riomar e interditou o alojamento dos trabalhadores da MASTEL. Em retorno ao local de trabalho e alojamento, os auditores constataram que os trabalhadores continuavam nas mesmas condições de alojamento, o que implicou em lavratura de auto de infração por desrespeito à interdição e o remanejamento imediato dos trabalhadores para local adequado. A empresa informou hoje, que os trabalhadores estão hospedados em um hotel da cidade, com endereço conhecido pela equipe de fiscalização.

O resgate dos trabalhadores, que representa o pagamento das verbas rescisórias, emissão de guia de seguro desemprego especial para trabalhador resgatado e o retorno deles para suas cidades está determinado para ocorrer no próximo dia 20. Vários documentos relacionados à contratação dos trabalhadores e à prestação dos serviços foram apreendidos e estão sendo analisados, para continuação da presente ação de fiscalização.

Do MTE

Rendimento de trabalhadores sem carteira cresce mais do que de formais

O crescimento do rendimento médio real do trabalhador que não tem carteira assinada foi bastante superior ao avanço dos rendimentos dos empregados que são oficialmente registrados, mostram dados divulgados hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Os empregados com carteira, no setor privado, receberam, em média, R$ 1.480,30 em julho, o que representa avanço de 1,3% na comparação com junho, e de 2,5% ante o mesmo mês do ano passado. Já aqueles que não têm carteira assinada receberam, em média, R$ 1.272,30 em julho, e viram seus rendimentos crescerem, 6,9% em relação ao mês anterior, e 12,2% em relação a julho de 2010.

No total do país, o rendimento médio real dos trabalhadores brasileiros alcançou R$ 1.612,90, o que representa avanço de 2,2% frente aos R$ 1.577,89 registrados em junho. Já na comparação anual, a alta de 4%, porque em julho de 2010 a média salarial do país havia ficado em R$ 1.550,26.

Os dados do IBGE mostram que a pressão do custo da mão de obra sobre o setor de serviços prestados a empresas é o maior entre os pesquisados, tendo registrado crescimento de 7,1% em julho sobre junho, chegando à média de R$ 2.072,30, embora na comparação com igual mês do ano passado o valor seja somente 0,3% superior.

Outro setor de destaque é o da construção, cujos salários ficaram 2,3% maiores na passagem de junho para julho, ao alcançarem média de R$ 1.357,20. Na comparação anual, a alta foi de 3,1%.

Em 12 meses, o setor que registrou maior alta média de salários foi o do comércio, com 6,1%, embora em julho, em relação a junho, a alta tenha sido de 0,9%.

Na indústria, os salários registraram alta de 0,5% em relação a junho, e 4,6% na comparação com julho de 2010.

Do Valor Econômico

Trabalho forçado: três operários são libertados de obra pública em SP

O sonho de “ganhar a vida” trabalhando na maior cidade do país virou pesadelo para três jovens maranhenses. Eles foram libertados de condições análogas à escravidão de uma obra de moradia popular do Governo do Estado de São Paulo em plena região central da capital.

“Fiquei com medo de virar mendigo em São Paulo”, confidenciou Jonas*, 21 anos, à Repórter Brasil. Atraído pelas promessas de um “gato” (aliciador de mão de obra) que acenou com salários superiores a R$ 800 mensais no aquecido mercado da construção civil, o operário convidou outros dois amigos do município de Colinas (MA) a embarcar rumo à empreitada.

Para chegar até a metrópole, Jonas teve de emprestar dinheiro de familiares. Ele e seus dois amigos decidiram se arriscar na longa viagem de transporte clandestino de Presidente Dutra (MA) – município de onde partem muitos ônibus levando gente para trabalhar em diversas regiões do Brasil – até o Terminal Rodoviário Princesa Isabel, ainda no início de abril.

A realidade encontrada no canteiro de obras foi bem diferente das expectativas. Depois de um mês na lida, recebeu apenas R$ 340 em maio. Mesmo assim, continuou a trabalhar por mais um mês e meio na esperança de que as coisas mudassem, mas nenhum outro pagamento foi feito.

“[Eu] não podia comprar uma pasta de dente, um sabonete. Como ia ficar vivendo aqui nesta cidade? Não tinha como ir embora, nem sair, nem nada”, desabafou Jonas. Diante da situação, ele e seus amigos foram buscar direitos junto à representação do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) na cidade de São Paulo (SP). “Fiz isso porque não tinha como voltar pra minha casa. Não tinha dinheiro nenhum, mesmo trabalhando duro”.

Detectado o aliciamento ilegal e constatada a impossibilidade de ir e vir pela ausência de pagamento de salários, os três foram libertados pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE-SP). Eles atuavam como subcontratados da Construtora Coccaro, responsável pela obra do Conjunto Habitacional Bela Vista – na Rua Conde de São Joaquim – da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), órgão do governo estadual paulista. O empreendimento tem suporte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) federal.

“A gente não aguentava mais reclamar para o chefe de obra e para o pessoal do administrativo da Coccaro, que não faziam nada”, contou Jonas. Da supervisão, eles ouviam apenas que era preciso ter tranquilidade, pois caso realmente houvesse problema na hora de receber pelo serviço prestado por meio da terceirizada, “a Coccaro pagaria”. Jonas e os colegas chegaram até a paralisar o que estavam fazendo por duas vezes, mas acabaram sendo convencidos a retornar ao trabalho. Diante da crescente aflição, ele antecipou inclusive que poderia ir ao MTE, mas ninguém acreditou.

Quando a fiscalização da SRTE/SP chegou ao local, encontrou 24 trabalhadores. Eles atuavam por sete “empresas” terceirizadas prestadoras de serviços. Uma delas era a Vale Navegantes Empreiteira Ltda., que tem como sócio-administrador Fabiano Oliveira de Amorim. Depois de ter aliciado Jonas e seus colegas, Fabiano sumiu sem dar explicações.

Durante as apurações, descobriu-se que o “sócio-administrador” atuava, de fato, como “gato” e até falsificou o registro em carteira de Jonas na documentação encaminhada à Coccaro para prestar contas, como explica Giuliana Cassiano, do Grupo de Erradicação do Trabalho Escravo Urbano da SRTE/SP. A fiscalização foi acompanhada por representantes do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de São Paulo (Sintracon-SP).

Real empregador

A terceirização acabou precarizando a relação de trabalho, avaliam os membros da SRTE/SP que atuaram no caso. A Vale Navegantes, subcontratada pela Coccaro, não dispunha de idoneidade econômica para prover a quitação dos salários, benefícios, tributos e contribuições sociais, bem como obrigações referentes à segurança e saúde, advindos da contratação de trabalhadores, explicitou o auditor fiscal Luís Alexandre Faria.

O relatório de fiscalização frisa que a terceirizada não possui “capacitação técnica” para fornecer, de forma autônoma, os serviços para a qual foi contratada. A subcontratada, conforme o mesmo documento, prestou única e exclusivamente para “colocar trabalhadores à disposição de outra empresa, ou seja, locar mão de obra, disfarçando e encobrindo o verdadeiro empregador, mediante simulação de contrato de prestação de serviços”.

Várias irregularidades relacionadas ao meio ambiente de trabalho foram encontradas na visita à obra. A área de vivência e os alojamentos foram interditados porque estavam em condições irregulares. A fiscalização apontou ainda oito quesitos graves de risco à saúde e segurança que foram descumpridos pela empresa. As instalações elétricas eram irregulares e os fios ficavam expostos. No total, foram lavrados 11 autos de infração pelas irregularidades encontradas.

De acordo com Claudinei Faleiros, gestor da obra no Conjunto Habitacional Bela Vista, situado no bairro de mesmo nome, a Coccaro recebeu com surpresa a denúncia de aliciamento e trabalho escravo. “Estamos há 20 anos no mercado e nunca passamos por isso”, declarou. O engenheiro explicou que a empresa atendeu prontamente à SRTE/SP e ao sindicato da categoria para regularizar a situação e pagar os trabalhadores. “Nós somos solidários. Os problemas que estes trabalhadores relataram não chegaram até mim. Se tivessem chegado, teríamos resolvido”, adicionou Claudinei. Para a fiscalização, contudo, as presenças de um técnico de segurança designado e do engenheiro civil responsável pela construção dos apartamentos demonstram claramente “que a empresa sabia dos problemas”.

O gestor da obra disse ainda que a Coccaro exige das terceirizadas a comprovação do registro na Carteira de Trabalho e da Previdência Social (CTPS) e do recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), como forma de evitar “problemas”. “Já estamos mudando em relação às terceirizadas. Buscamos agora contratar os trabalhadores diretamente e só terceirizar a parte de instalação, por exemplo”, explicou.

Os três resgatados receberam R$ 5,7 mil cada e retornaram para o Maranhão no último dia 19 de julho, com as despesas pagas pela Coccaro.

Reações ao flagrante

A Corregedoria Geral da Administração do Estado de São Paulo instaurou processo correcional (Processo CGA-SH nº 136/2011) para apurar as denúncias de utilização de mão de obra aliciada por meio de tráfico de pessoas. O processo foi provocado por um ofício enviado pela Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania, por meio do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, à Secretaria da Habitação.

Em nota enviada à Repórter Brasil, a Secretaria da Habitação garantiu que a CDHU realiza, por meio de sua “fiscalizadora”, observação in loco das condições oferecidas pelas empreiteiras aos seus trabalhadores. Essa observação, reforça, inclui “as relações trabalhistas e de segurança individual e coletiva”. “Todos os eventos em desacordo com os procedimentos legais”, informou o órgão, “são registrados em livro de ocorrências, sendo exigido o pronto atendimento à legislação por parte das contratadas”.

Com relação ao empreendimento Bela Vista, a secretaria sustentou que, após o recebimento da denúncia em 15 de julho, a CDHU e o MTE realizaram uma fiscalização no local. “Foram feitas análises das condições de trabalho e da documentação apresentada e não se constatou irregularidades no canteiro de obras”, discorreu o órgão que, sem demonstrar qualquer constrangimento, cravou a “informação” completamente equivocada de que o “Ministério do Trabalho deu por encerrado o processo”.

Na realidade, auditores fiscais do MTE realizaram a ação em 12 de julho, antes da data citada pela CDHU, e finalizaram a fiscalização em 29 de julho, após pagamento e retorno dos trabalhadores e lavratura dos autos de infração pelas irregularidades constatadas. O flagrante pode ensejar inclusive a futura inclusão da Coccaro na “lista suja” do trabalho escravo.

Casarão precário

Jonas chegou a trabalhar, juntamente com outros operários de Colinas (MA), na fase anterior da mesma obra entre junho a dezembro de 2010. Quando chegou pela primeira vez, o frio era intenso e ele não tinha nada para se cobrir. “Um colega de alojamento me emprestou um cobertor rasgado”.

Durante a primeira passagem, mais de 20 pessoas (incluindo Jonas) ficaram instaladas em um casarão sem nenhuma condição de abrigar trabalhadores (fotos ao lado), que será demolido em breve. A condição era degradante: não havia água potável e o ambiente era mal conservado, sujo e perigoso.

Na ocasião, a despeito do quadro lamentável de alojamento e das jornadas extenuantes de trabalho, ele recebeu cerca de R$ 700 mensais – o que acabou sendo um incentivo para que voltasse neste ano novamente. Já na primeira vez, não recebeu todos os direitos trabalhistas que lhe eram devidos.

As condições degradantes de alojamento e a jornada exaustiva que tiveram de enfrentar no ano passado poderiam caracterizar o trabalho análogo à escravidão, coloca a auditora fiscal Giuliana. “Os empregados trabalharam durante todos os feriados de 2010. Em outubro, por exemplo, trabalharam de domingo à domingo sem folga”, sublinha. Testemunhos à parte, para que haja libertações completas, é preciso que haja flagrante.

Antes de vir para a capital paulista, Jonas já tinha encarado outras empreitadas como migrante, assim como muitos de seus conterrâneos. “Já fui cortar cana no Mato Grosso e asfaltar estrada em Goiás”, contou. “Minha vontade é de trabalhar em Colinas (MA) mesmo. Não ter mais que ficar viajando, nessa incerteza”.

Problemas anteriores

A autuada Coccaro faz parte do grupo da construtora Faleiros, que já teve problemas recentes em outro canteiro de obras no interior paulista. Centenas de trabalhadores foram encontrados em condição degradante em Hortolândia (SP), mais especificamente na construção de 500 apartamentos residenciais com recursos da Caixa Econômica Federal. De acordo com a Procuradoria do Trabalho da 15ª Região (PRT-15), a Faleiros, responsável pela obra, subcontratou os serviços da construtora Itajaí, que acabou autuada.

Cerca de 250 pessoas foram alojadas em um espaço com estrutura para acomodar, no máximo, 150 operários. A obra foi embargada parcialmente por problemas de segurança, como risco de queda em andaimes e instalações elétricas irregulares. O flagrante ocorreu em maio.

Em 2009, a própria Coccaro assinou, por conta de outras irregularidades, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região (PRT-2) assumindo obrigações relacionadas ao meio ambiente de trabalho, de acordo com a procuradora Danielle Leite, em cumprimento à Norma Regulamentadora (NR) 18.

A procuradora promoveu diligência no último dia 18 de julho para verificar o cumprimento do TAC e encontrou uma série de irregularidades na própria obra do Conjunto Habitacional Bela Vista, da CDHU. “Até o momento, a empresa arcou com o valor de R$ 50 mil a título de compensação pelo descumprimento de cláusulas do TAC”, explica Danielle.

Por: Repórter Brasil