Falar de Joinville e não citar o bairro Itaum é esquecer-se do coração romântico da cidade, da boemia, dos trilhos de trem, do samba e futebol. E falar do Itaum sem o Fluminense e seu fundador, Egon Giesel, é apagar as páginas mais ricas do futebol amador da maior cidade catarinense. Aos 80 anos completados em 30 de abril, esse senhor tem em sua memória mais de sete décadas de amor ao esporte amador, e é um dos poucos remanescentes que fundaram o famoso clube da zona sul em 24 de outubro de 1949, em terreno da rua Voluntários da Pátria, próximo a atual Igreja São Judas Tadeu.
“Nosso time era o Estrela, a gente jogava nos muitos campinhos da época. Aí um dia resolvemos fundar um clube mesmo. Uns queriam o nome Botafogo, mas eu torcia pelo Fluminense, e o nome acabou vencendo por mais votos”, conta o descendente de alemães, filho de comerciante do ramo de panificação, nascido e criado na principal rua do bairro, a Monsenhor Gercino bem em frente ao famoso bar do Luizinho. Alto e forte, Egon jogava no meio de campo, mas logo machucou o tornozelo e passou a ser um comandante do clube. Foi diretor, treinador, e hoje ainda é conselheiro ouvido a cada mudança pretendida pela diretoria.
Sétimo de dez irmãos, Giesel começou a trabalhar aos 14 anos na Usina Metalúrgica Joinville, e depois na Companhia Hansen, onde ganhou seu primeiro presente: “Um cachimbo, um leque e uma garrafa de frisante”, conta. Ficou na empresa até 1964 quando abriu um bar e só fechou quando se aposentou, em 1977. Conciliando trabalho e o clube, o veterano comandante se orgulha de cada momento e conquista. “Tivemos nossa outra sede na Monsenhor Gercino, perto do Cesita (Fundamas), onde promovemos os melhores carnavais dos anos 1960 e outras décadas. Às dez horas já tinha de fechar a portaria”, lembra.
A fama do excelente futebol foi tão forte que o time chegou a ter o apelido de “Bailarinos do Itaum”, tal o refinamento do toque de bola e presença de craques. “Nós revelamos o Milton Fumo, que foi pro Vasco e depois Metropol; o Chelo que foi para o Caxias, o Ratinho, grande caráter, que foi para o Marcílio Dias, Portuguesa, Sao Paulo e encerrou carreira no Jec, o Chiquinho, e tantos outros”, relembra Egon. Da venda de Milton Fumo para o Vasco ele conta que a transação marcou época. “Foi por volta de 1963. Veio um cara deles e nós pedimos 200 mil cruzeiros na época. Passados alguns dias eles mandaram carta falando que pagariam 100 mil. Nós aceitamos, não tinha como manter ele aqui, um craque de bola, sem ganhar salários. Se oferecessem 20, também aceitariamos”, fala Egon sorrindo.
Outra negociação que o Fluminense realizou foi com o atleta Chelo, e a forma como foi feita mostra o romantismo da época. “Vendemos ele para o Caxias por um ano de treino e jogos no Ernesto Schlemm Sobrinho”, narra. Entre essa vida no futebol amador e cuidado com a família, Egon Giesel foi atraído para a política, onde foi vereador entre 1983 e 1988, eleito com 1.502 votos, sua única e ultima experiência na área. “O Luiz Henrique me convidou, os amigos apoiaram e venci a eleição. Depois fui vendo que aquilo não era para mim. Era muita gente pedindo”, diz sorrindo. Daqueles tempos ficou a conquista da sede atual do Fluminense, na rua Florianópolis, o Caldeirão do Itaum.
“Sem campo para treinar e jogar, sempre fomos campeões. Quando conseguimos, pensamos: agora vamos ganhar todas. Nunca mais fomos campeões”, comenta entre risadas. Casado há 57 anos com dona Zulma, pai de Cézar, Sandra e Tania, cinco netos, hoje seu Egon descansa em sua casa no Itaum ao lado dos familiares, e recebe visitas constantes de conhecidos de tantas décadas no esporte. Ainda dá seus pitacos no velho Fluminense. “Já disse pro Gaspar (ex-vereador), não vende isso aí não hein”, sobre o grande complexo esportivo onde funcionam escolinhas de futebol, sede social e até uma creche. Quer saber algo do Itaum ou do esporte amador das ultimas sete décadas? Fale com Egon Giesel.
* Publicado na seção Perfil do Jornal Notícias do Dia de Joinville (SC) em maio de 2011.